30 novembro 2003

Vou...

...de férias. Pois é, vou tirar uma semana de (merecido) descanso. Vou aproveitar para pôr o sono e a leitura em dia, vou ver alguns filmes que me interessam, dedicar algum tempo aos amigos e a mim própria. Durante esta semana, o Convento ficará entregue ao abade João. Estarei de volta no dia 9.

Até lá, fiquem bem.

"I know not what tomorrow will bring"

Fernando Pessoa morreu a 30 de Novembro de 1935 no Hospital de S. Luís dos Franceses. Hoje é o 68º aniversário da data da sua morte.

Tudo quanto penso,
Tudo quanto sou
É um deserto imenso
Onde nem eu estou.
Extensão parada
Sem nada a estar ali,
Areia peneirada
Vou dar-lhe a ferroada
Da vida que vivi.


Fernando Pessoa, Tudo quanto penso

...


Wilde

"Neste mundo há somente duas tragédias. Uma é não conseguir o que se quer, a outra é consegui-lo"

Oscar Wilde nasceu a 16 de Outubro de 1854 em Dublin, Irlanda.
Morreu a 30 de Novembro de 1900.

(...)

Then he flew back and told the Prince what he had seen.

"I am covered with fine gold," said the Prince, "you must take it
off, leaf by leaf, and give it to my poor; the living always think
that gold can make them happy."

Leaf after leaf of the fine gold the Swallow picked off, till the
Happy Prince looked quite dull and grey. Leaf after leaf of the
fine gold he brought to the poor, and the children's faces grew
rosier, and they laughed and played games in the street. "We have
bread now!" they cried.

(...)

"Bring me the two most precious things in the city," said God to
one of His Angels; and the Angel brought Him the leaden heart and
the dead bird.

"You have rightly chosen," said God, "for in my garden of Paradise
this little bird shall sing for evermore, and in my city of gold
the Happy Prince shall praise me."


Oscar Wilde, Happy Prince

Lisboa, menina e moça

No castelo ponho o cotovelo
Em Alfama descanço o olhar
E assim desfaço o novelo
De azul e mar

À Ribeira encosto a cabeça
A almofada da cama do Tejo
Com lençois bordados à pressa
Na cambraia de um beijo.


Refrão:
Lisboa menina e moça, menina
Da luz que os meus olhos vêem, tão pura
Teus seios sãos as colinas, varina
Pregão que me traz à porta ternura

Cidade a ponto luz bordada
Toalha à beira mar estendida
Lisboa menina e moça e amada
Cidade amor da minha vida

No Terreiro eu passo por ti
Mas na Graça eu vejo-te nua
Quando um pombo te olha sorri
És mulher da rua.

E no bairro mais alto do sonho
Ponho o fado que sei inventar
A aguardente de vinho e medronho
Que me faz cantar.

Refrão

Lisboa do amor deitada
Cidade por minhas mãos despida
Lisboa menina e moça e amada
Cidade mulher da minha vida.


Ary dos Santos / Paulo de Carvalho - Lisboa, Menina e Moça

28 novembro 2003

Enigma


Banho Alvalade XXI

Estas duas imagens têm algo em comum... o que será ?

Afinal...


siberian tiger
@...

...sempre existe alguém a quem um casaco de peles fica bem!

(des)Conto Infantil - Parte II

(continuação)
Chegado ao local, o agente tentou logo mostrar à nossa princesa, toda a maravilhosa paisagem que envolvia a barraca. Mostrou-lhe edifícios, uns em cima de outros, sem qualquer ordenação territorial. Uma amálgama de formas que parecia saída de um qualquer aperitivo do Frank Gehry em fim de jantar.
A princesa, olhou em volta e o que mais gostou foi daqueles "arcos lindos" que cruzavam a avenida.
- Que maravilha! Abriram arcos no muro para passar o trânsito. Somos um povo bestial! - exclamou.
- Desculpe menina, mas os arcos já existiam. Aquilo é um aqueduto, e não um muro.
- A sério ?? Ninguém diria! E serve para quê ?
- Servia para levar água para a cidade de Lisboa.
- Ahhhhh! Pelo aspecto já deve ser do tempo do João Só Ares.
O agente imoboliário engoliu em seco e resolveu apressar o negócio. Entraram então em casa, e logo na entrada, um fabuloso hall recebeu-os. A princesa, deu uma volta pela casa, e soltando um grito histérico (assim do género: Áiiiiiii!) cai para o chão. O agente tentou então reanimar a princesa, com estaladas para cima e estaladas para baixo. Pela porta entreaberta, vários curiosos que entretanto quiseram ver a nova inquilina, ao ver o vendedor à estalada à princesa, chamaram de imediato a PSP, que ao chegar ao local, algemou e levou o vendedor para os calabouços mais próximos acusado de agressão. A princesa, coitada, continuava inanimada no chão. Os vizinhos sempre solícitos, resolveram ajudar, levando cada um para a sua casa, um dos malões que entretanto a companhia de mudanças, havia entregue. Num ápice a entrada da barraca ficou deserta e a princesa estendida, sózinha no chão. Ao fim do dia, dois jovens residentes no bairro, ao ver a porta daquela barraca aberta, resolveram entrar. Viram então que a casa estava vazia, com excepção da presença da nossa princesa. Descontraídos, resolveram acender um charro e fumá-lo. Ao fim de duas passas, o fumo que pairava no ar, chegou ao narizinho empinado da nossa princesa. Ela abriu os olhos e a primeira coisa que viu foi dois jovens fumando o seu charro. De imediato, levantou-se, e dirigindo-se a eles, pediu uma passa, que inspirou com agrado.
Os jovens, passado o susto inicial da reanimação da princesa, mostraram-se agradados com a sua presença.
- Como te chamas ? - perguntaram em coro.
- Marisa. E vocês ?
- Eu sou o Joaquim Estrela e ele é o José Palácio-Negro.
- Vocês salvaram-me a vida. Sou vossa. Façam de mim o que quiserem.
Um sorriso nasceu naquelas faces, e após um abraço apertado a três, deu-se início a uma bela amizade e cumplicidade. Tendo aquele trio vivido feliz para sempre. (FIM)

27 novembro 2003

Receita do Dia

A receita de hoje é Migas de Natal

18 colheres de sopa açúcar
canela (q.b.)
125 gr de miolo de noz
12 ovos


Misture os ovos com o açúcar, bata e leve a lume brando até começar a engrossar.
Retire do lume, mexa novamente, junte a noz partida aos bocadinhos e deite numa travessa.
Polvilhe com canela.

Simples!
Bom apetite.

Novidades tecnológicas

Japonesa Sanyo lança CD ecológico à base de milho

A empresa japonesa Sanyo vai começar a comercializar no próximo mês CDs à base de milho. Segundo a edição desta quinta-feira do Financial Times, o «MildDisc» terá capacidade para armazenar dados informáticos, música e vídeo. O aspecto será o mesmo de um CD convencional. O objectivo desta invenção é evitar a acumulação de CDs obsoletos juntamente com os resíduos sólidos urbanos e também aproveitar a crescente procura de produtos ecológicos.

no Diário Digital


Na cozinha

- Óh Querido, traz-me o CD da Monserrat Caballe.
- Então porquê ?
- Apetece-me umas pipocas!!
- Não preferes umas pipocas light ?
- Tens razão. Dá-me antes o da Kylie Minogue...

Maravilhoso chocolate, maravilhoso!

Dizer que sou uma chocólatra não será novidade para ninguém. Já o assumi aqui mais do que uma vez. Mas nem todo o chocolate me serve no palato! Ontem descobri mais uma fonte promissora de prazeres degustativos incomparáveis. Chama-se Heróis, fica no Chiado em Lisboa, na primeira transversal da Rua Garrett, à direita de quem sobe em direcção ao Largo de Camões. É um bar simpático, bem decorado, gay friendly e onde se pode beber um chocolate de sorver e chorar por mais! Espesso, aveludado, doce ma non troppo, com um toque de natas e uns salpicos de canela, enfim um luxo!

Se puderem, vão até lá. De preferência cedo e durante a semana. Ao fim de semana o sítio fica demasiado cheio e a música sobe de tom, o que invalida o prazer de uma boa conversa. E pronto, é no Chiado, onde Lisboa passa por nós cheia de graça e sempre bonita.

(des)Conto Infantil - Parte I

Era uma vez uma princesa que morava numa linda vivenda na Quinta da Ponteaguda com o seu pai, um cirurgião plástico famoso e a sua madrasta, uma bela ex-modelo de catálogos de lingerie, totalmente moldada em silicone pelas preciosas mãos do cirurgião.

A princesa tinha uma vida muito má, pobrezinha! A madrasta, terrível, levantava-se todos os dias às 11 horas da manhã e ligava a televisão aos altos berros, enquanto repetia os exercícios de yoga que o mestre Oprah Noodlemantra lhe tinha vendido em 600 cassetes VHS. A nossa princesa, acordava atarantada, e ainda com a boca a saber a papel de música polvilhado com cortiça, depois da noitada na discoteca da moda a Periferia, ali para os lados da Brandoa. Ao acordar assim, e ainda com os restos da noite bem passada, a fazer sentir a sua presença no organismo, a nossa princesa, passava sempre o resto do dia rodeada de sacos de gelo, sorvendo goladas de Guronsan, para tentar debelar a sua enorme dor de cabeça.

Um dia, após tantas manhãs desperdiçadas acordada, a nossa princesa tomou uma decisão. Agarrou no seu cartão de crédito Gold, encheu com umas roupitas 4 malões Louis Vuitton (que deixou na entrada da sua vivenda para serem resgatados pela Companhia de Mudanças Vou Num Pé e Volto Noutro), e atestando o seu cabriolet para uma viagem que não sabia onde terminaria, fez-se à estrada.

Após cerca de 3 horas, perdida no trânsito dos arredores da cidade de Lisboa, onde quase foi vítima de 12 acidentes, culpada de 3 atropelamentos e um manguito para o fogareiro que teimou em meter-se à sua frente, chegou finalmente ao seu destino: a Cova da Loba, ali para os lados da Esburacada.

Durante o caminho, e através do seu telemóvel XXS topo de gama, tinha entrado em contacto com uma imobiliária, a quem tinha alugado uma barraca de 7 assoalhadas, terraço e jardim com piscina.
Chegando à Cova da Loba, e estacionando o seu cabriolet em frente à sua nova moradia, a princesa ligou então para a companhia de mudanças para lhes dar o endereço onde deveriam entregar as suas "malinhas". Ao seu encontro foi também o agente imobiliário, responsável pelo aluguer da barraca. (continua brevemente)

Arte do dia


Chagall


La Mariee, Marc Chagall

Happiness wouldn't be happiness without a violin-playing goat
(Julia Roberts em Notting Hill)

26 novembro 2003

Receita do Dia

A receita de hoje é Papos de Anjo


Papos de Anjo
@Arca Universal

9 gemas
1kg de açúcar (aproximadamente)
1,5 litro de água
margarina para untar as formas

Passe as gemas por uma peneira e bata na batedeira até crescerem e ficarem bem fofas, claras e espumosas. Enquanto isso, unte as formas de empadinhas com margarina derretida.
Encha as forminhas até a metade com as gemas batidas e deixe assar em banho-maria, forno moderado, por aproximadamente 30 minutos, até crescerem acima das forminhas.
Numa panela grande faça uma calda com o açúcar e a água.
Retire os papos-de-anjo das forminhas e coloque-os na calda fervendo, em fogo baixo e deixe ferver por 15 a 20 minutos, até que a calda engrosse um pouco.
Retire do fogo e coloque numa taça grande, despejando também a calda.

(Se desejar os papos-de-anjo podem ser colocados numa peneira e deixados ao sol para secar. Com esse processo, ficam crocantes por fora e deliciosamente úmidos húmidos por dentro.)

Bom Apetite (molhados ou secos...são deliciosos)

Tempo dos assassinos

Já que se falou nele ali em baixo, aqui fica a origem do "tempo dos assassinos". Quem quiser conhecer mais sobre Rimbaud, o poeta rebelde, pode consultar a sua biografia.

Matinée D'Ivresse - Arthur Rimbaud

Ô mon Bien ! Ô mon Beau ! Fanfare atroce où je ne trébuche point ! Chevalet féerique ! Hourra pour l'œuvre inouïe et pour le corps merveilleux, pour la première fois ! Cela commença sous les rires des enfants, cela finira par eux. Ce poison va rester dans toutes nos veines même quand, la fanfare tournant, nous serons rendus à l'ancienne inharmonie. Ô maintenant, nous si dignes de ces tortures ! rassemblons fervemment cette promesse surhumaine faite à notre corps et à notre âme créés : cette promesse, cette démence ! L'élégance, la science, la violence ! On nous a promis d'enterrer dans l'ombre l'arbre du bien et du mal, de déporter les honnêtetés tyranniques, afin que nous amenions notre très pur amour. Cela commença par quelques dégoûts et cela finit, - ne pouvant nous saisir sur-le-champ de cette éternité, - cela finit par une débandade de parfums.
Rire des enfants, discrétion des esclaves, austérité des vierges, horreur des figures et des objets d'ici, sacrés soyez-vous par le souvenir de cette veille. Cela commençait par toute la rustrerie, voici que cela finit par des anges de flammes et de glace.
Petite veille d'ivresse, sainte ! quand ce ne serait que pour le masque dont tu nous as gratifiés. Nous t'affirmons, méthode ! Nous n'oublions pas que tu as glorifié hier chacun de nos âges. Nous avons foi au poison. Nous savons donner notre vie tout entière tous les jours.
Voici le temps des ASSASSINS.




Manhã de Embriaguez - Arthur Rimbaud (traduzido por Ivo Barroso)

Oh meu Bem, oh meu Belo! Fanfarra atroz em que não mais tropeço! cavalete feérico! Hurra pela a obra inaudita e pelo corpo maravilhoso, pela primeira vez! Tudo começou com risos de crianças, com eles vai terminar. Este veneno permanecerá em nossas veias mesmo quando acabar a fanfarra e voltarmos à nossa antiga inarmonia. Ó, agora que somos tão dignos dessas torturas! recolhamos fervorosamente esta promessa sobreumana feita ao nosso corpo e à nossa alma criados: esta promessa, esta demência! A aparência, a ciência, a violência! Prometeram-nos enterrar na sombra a árvore do bem e do mal, desterrar as honestidades tirânicas, para que pudéssemos realizar o nosso amor mais puro. Começou com certas repugnâncias e terminou, - não nos sendo possível apreender de imediato esta eternidade, - terminou com uma debandada de perfumes.
Risos de crianças, discrição dos escravos, austeridade das virgens, horror das faces e objetos daqui, sagrados sede vós pela lembrança desta vigília. O que havia começado com toda a grosseria, eis que vai acabar em anjos de chama e gelo.
Curta vigília de embriaguez, sagrada! ainda que não seja pela máscara com que nos gratificaste. Nós te confirmamos, método! Não nos esquecemos que ontem glorificaste cada uma de nossas idades. Temos fé no veneno. Sabemos dar a nossa vida inteira todos os dias.
Eis o tempo dos Assassinos.


Galito


Enviaram-me este bicharoco e eu achei-lhe graça. Como hoje só escrevi coisas tristes e nostálgicas, aqui fica para acabar bem o dia.

Cinema Paraíso

Desde pequena que adoro cinema. Ir ao cinema foi sempre uma festa, uma antecipação de magia, uma passagem para outros universos, outras histórias, carregadas de emoções.

Confesso que os cinemas em série dos centros comerciais, as pipocas, e a falta de educação de alguns espectadores esfriaram um pouco o meu encantamento, mas enquanto existirem o King, o Quarteto, o Londres, O Nimas e o Ávila, ir ao cinema continuará a ser sempre uma ocasião solene.

Lembro-me do Monumental e da última vez que lá entrei para ver cinema (nunca lá assisti a nenhuma peça, a alma da Srª D. Laura Alves que me perdoe, mas no pouco que a televisão me deixou ver do seu trabalho, admiro-lhe sem dúvidas o talento e a paixão). "Flash Gordon", o último filme antes do encerramento definitivo, creio eu, do filme lembro-me pouco, apenas que tinha música dos Queen, mas da sala lembro-me bem.

Lembro-me do Condes e dos seus cartazes gigantescos, alguns verdadeiras obras de arte. Para onde foram os artistas que os pintavam? Ainda não entrei no Hard Rock Caffe porque me entristece descobrir destroços daquela sala imponente.

Mas de todos, o meu preferido era o Éden. Não me consigo conformar com o facto de já não existir. Resta a fachada, ou parte dela, como que a dizer "Vêem como nós somos bons? Destruímos a sala de espectáculos, demos cabo do seu interior, matámos a função do espaço, recortámos a fachada, mas mantivémos estes bocadinhos porque gostamos de arte e sabemos reconhecer o seu valor.". Valia mais que o tivessem demolido por completo, como fizeram ao Monumental. Seria preferível a mutilarem-no daquela maneira.

Resta-nos o filme "Até ao fim do mundo" de Wim Wenders, um alemão que parece amar Lisboa muito mais do que a maioria dos lisboetas. Devem ser essas as ultimas imagens da magnífica escadaria interior do Éden.

O Politeama foi, em boa hora, comprado e recuperado. Já não passa cinema, mas tem estado sempre activo como sala de espectáculos graças ao Sr. Filipe La Féria. Embora não seja sua admiradora nem espectadora assídua dos seus espectáculos, tenho de aplaudi-lo e agradecer-lhe por não Ter deixado mais esta sala cair em esquecimento e ficar à espera que o Odeon, o Olímpia e o antigo Animatógrafo do Rossio (hoje uma sex shop) possam também ser recuperados e restituídos à sua função original.

Às vezes acontece-me ter saudades de uma época que não vivi. Os velhos cinemas transportam-me a uma época em que o cinema era um milagre e um mistério e ir ao cinema tinha honras de grande acontecimento.

Os dias infelizes

Muito se fala em violência doméstica nos dias que passam. E é bom que se fale, porque há assuntos que apenas se esgotam quando deixam de existir e este ainda sobrevive, camuflado sob o medo, a decência e os bons costumes e uma certa ideia de que as mulheres devem obediência e respeito aos seus maridos. Não concordo com a obediência, como é lógico, mas o respeito, tal como o amor, é uma rua de dois sentidos: dá-se e recebe-se em igual medida, ou então depressa se esgota.

Falar sobre a violência entre o casal - tinha escrito "violência contra as mulheres" mas não podemos esquecer que a violência assume muitas formas e também há homens que são vítimas, embora estes casos sejam mais raros porque menos falados. Uma vez mais, é uma questão de costume: é mais facilmente aceite que uma mulher assuma uma posição de fragilidade. Se um homem confessar que é vítima de violência física ou psicológica, das duas uma: ou é olhado com desconfiança ou se torna alvo de chacota: "Então este gajo não tem mãos?"...

Como ia dizer, falar sobre a violência entre o casal é necessário e urgente. Pelas vítimas directas e pelas outras vítimas, as que poderão não sofrer as agressões na pele, mas sem dúvida as sofrem na alma. Filhos, pais, irmãos, amigos, todos são testemunhas silenciosas e impotentes pois o acto de coragem que é a denúncia cabe apenas à vítima directa. É preciso perder o medo, sussurram. É urgente denunciar os agressores, dizem. É necessário voltar a viver, gritam.

É tudo verdade, mas então, se todos reconhecem que a violência doméstica existe, se todos são (aparentemente) unânimes em afirmar que é preciso denunciar alto e bom som quem a pratica para acabar de uma vez por todas com a impunidade destes crimes que chegam por vezes ao assassinato, então porque é que assistimos, nestes estranhos dias que nos assombram, à inversão de posições em que a vítima é sempre prisioneira, quer permaneça em casa sem fazer a denúncia, quer decida fazê-la? Neste caso, é outro medo, talvez maior porque desconhecido, o medo de andar na rua, de ser apanhada por uma fúria agora maior porque acirrada, o viver num albergue ou em casa de familiares, num espaço alheio, até que o agressor seja levado à justiça e depois, voltar a viver numa prisão de medo porque a justiça não funciona, porque a máxima “entre marido e mulher, ninguém meta a colher” continua válida não apenas para o povo, mas também para os tribunais. Em contrapartida, o agressor é sempre livre. Livre de bater, de torturar, de aterrorizar, de matar.

Brecht disse que este é o tempo dos assassinos. O primeiro assassino é o silêncio. O segundo somos nós, agressores, vítimas e todos quantos sabemos que a violência existe e, mesmo assim, insistimos em virar as costas, encolher os ombros e seguir caminho, a assobiar para o ar o nosso incómodo. Não é nada connosco, logo não é problema nosso.

A montanha

(ou uma cordilheira - Alpes, neste caso) pariu um rato. Após as notícias vindas a público na semana passada, sobre o destino da 32ª edição da America's Cup, as quais apontavam Valência como a cidade escolhida, poucos acreditavam que esta competição viesse para Portugal. Hoje a confirmação foi feita oficialmente. Às vezes, o que parece... é.

"Valência vai ser palco da 32ª edição da Taça América. A decisão foi anunciada às 10:50 horas pela AC Management (entidade organizadora sediada na Suíça). De fora ficou Lisboa, Marselha e Nápoles, todas elas candidatas a esta competição."
in Diário Digital

25 novembro 2003

Receita do Dia

A receita de hoje é Barrigas de freira


Barriga de Freira
@Centuris

450gr de acúcar
15 gemas
1 colher de sopa de manteiga
5 ovos (completos)

Deite o açúcar num tacho, cubra com água e leve ao lume.
Ferva até obter uma calda em ponto de pérola.
Numa tigela misture, os ovos e as gemas.
Deite a gemada num funil fino e verta-a em círculos sobre a calda fervente, até cobrir o fundo.
À volta do doce, deite pedacinhos de manteiga para que este não adira ao tacho.
Com dois garfos, faça girar o doce para apurar uniformemente.
Faça furos no centro e deixe acabar de cozinhar.
Deixe arrefecer e mude para uma travessa.

Bom Apetite!

Arte do dia


ChatNoir

@Katten Kabinet

Théophile Alexandre Steinlen (1859 - 1923)


Eça de Queirós


Eça de Queirós
@Instituto Camões

Foi com Eça de Queirós que eu descobri a leitura.
Primeiro por obrigação, depois por prazer.
Eça nasceu há precisamente 158 anos, a 25 de Novembro de 1845, na Póvoa De Varzim. Morreu em 1900 em Neuilly, Paris. Ao longo da sua vida escreveu inúmeras obras. Algumas polémicas, outras nem tanto. A sua biografia encontra-se aqui.

Quando fui obrigado a ler "Os Maias" para a disciplina de Português, e mais tarde, participar num trabalho de grupo que tinha como pano de fundo os presságios e a sua importância nessa obra, apaixonei-me por aquele modo de escrever, aquela crítica à sociedade de costumes. Nessa altura, escrevi também o que se segue, a biografia de Eça em verso... e apenas isso. Um devaneio. Que me perdoem os literatos.



A biografia de Eça em verso

José Maria de Eça de Queirós,
Um nome a fixar,
Nada mais que o assunto
Que nesta biografia vamos tratar.

Tendo na Póvoa nascido,
No ano de 1845,
Abraçou a arte de escrever
E trabalhou-a com afinco.

Estudou leis em Coimbra,
Amigo de Teófilo e Antero de Quental,
Com eles criou
Um novo clima intelectual.

Começou a escrever apenas
No fim do Curso que em Coimbra cursou.
"Notas Marginais" ... a sua estreia,
Uma obra que espantou .

Vem para Lisboa exercer advocacia,
Mas aceitando a redacção de um Jornal,
Tem uma curta estada em Évora,
Regressando depois á capital.

Assiste á inauguração do Canal do Suez,
Numa viagem que efectuou ao Oriente,
Expondo no livro "O Egipto" as impressões
Da viagem ao país do sol quente.

O "Mistério da Estrada de Sintra",
É publicado em folhetins num Jornal,
É a sua primeira tentativa ficçionista,
Tendo em Ramalho, participação especial.

Eça participou também na Questão Coimbrã,
E já em Lisboa nas conferências do Casino,
Defendeu o Realismo como nova expressão de arte,
Como o aristotelismo foi defendido por Aquino.

Abraça então a carreira administrativa,
Indo para Leiria como administrador,
Escreve aí "O Crime do Padre Amaro",
Iniciando-se como "romanceador".

Concorrendo para uma carreira diplomática,
É colocado em Havana e mais tarde em Inglaterra,
Não regressando a Portugal senão em curtos períodos,
Menosprezando assim a sua pátria, a sua terra.

Em Inglaterra, escreve "O Primo Basílio",
O primeiro romance em volume editado,
Publicando de novo "O Crime do Padre Amaro",
O mesmo romance, mas muito remodelado.

Com "A Capital" na gaveta e na forja "Os Maias",
"A Relíquia" e "O Mandarim" ele escreveu,
Envolvendo-se em negócios de saias,
Casa com a irmã de um amigo seu.

Sendo nomeado cônsul para Paris ,
Manda as suas obras para o Brasil e Portugal,
Os Bilhetes de Paris, Cartas Familiares - o exemplo
Do seu espólio, património nacional.

Para além da sua colaboração em Jornais,
Fundou Eça, a Revista De Portugal,
Onde colaboraram companheiros de geração,
Como Moniz Barreto, Oliveira Martins e Antero De Quental.

Em 1900 morre em Neuilly, na sua residência,
Legando-nos um espólio literário variado,
Desde Cartas a Contos, parando no Romance,
Sendo este o seu estilo privilegiado.

Com a morte de Eça de Queirós ,
E o suicídio de Antero de Quental,
Entristeceu-se toda uma Geração,
A dos Vencidos Da Vida, a da revolução nacional.

Mais

uma linda imagem que chegou por mail. Aqui fica demonstrada a verdadeira união familiar.


Que irmão tão querido...

24 novembro 2003

Receita do Dia

Um convento sem doces é como um dia de verão sem sol. Por isso, inicia-se aqui mais uma (doce) rubrica: Receita do Dia.
Para inaugurar... aqui fica a receita de um doce divino.

Toucinho do Céu

100 g de amêndoas (peladas e raladas)
8 gemas de ovos
200 g de açúcar
20 g de manteiga
canela em pó
1/2 copo de água
açucar glacé para enfeitar
1 clara

Escalde as amêndoas, retire-lhes a pele e rale-as finamente.
Leve ao lume a água e o açúcar, deixe ferver até obter uma calda nem muito espessa nem muito líquida.
Junte as amêndoas e deixe ferver por 5 minutos.
Em seguida bata a mistura com uma batedeira eléctrica e deixe esfriar.
Bata as gemas e adicione-as à misture anterior.
Leve de novo ao lume sem parar de mexer até que a mistura se solte das paredes do tacho.
Retire do lume e deixe amornar.
Bata a clara em castelo e misture com o creme de amêndoas.
Unte uma forma redonda com manteiga e leve a forno médio durante 30 a 40 minutos.
Desenforme, deixe arrefecer, polvilhe com o açucar glacé e canela em pó e sirva.

Bom Apetite.

Lista de espera

Segundo o Diário Digital, uma empresa alemã - GSMK - vai lançar um telemóvel que impossibilita a realização de escutas telefónicas.

Apesar de o modelo não ter sido ainda lançado, pelo que consegui apurar, encontram-se já em lista de espera, várias encomendas para Portugal... tendo como destinatários várias figuras ilustres da vida pública portuguesa.

Sentidos

Eu creio na carne e nos apetites,
Ver, ouvir, sentir, são milagres, e cada parte e apêndice de mim
é um milagre


(Luís Quintais e Pedro Paixão, Versão do poema 24 de “Song of Myself” de Walt Whitman, in “A Cidade Depois”)

Ask anyone what sense he would preserve above all others. Most would say sight, forfeiting a million eyes in the body for two in the skull. Blind, we could live and possibly discover wisdom. Without touch, we would turn into hunks of wood.

(Jim Morrison, texto publicado na revista “Eye”, in “Uma Oração Americana e Outros Escritos”)

Comecei hoje o “desafio dos sentidos”. Há uns tempos lembrei-me de fazer este jogo comigo mesma: viver um sentido por dia, ou seja dar-lhe relevância sobre os demais. O meu sentido de hoje é a audição e acreditem que, até agora, já ouvi coisas que nos outros dias me escapam. Mas não vou falar delas agora, que o dia ainda vai curto. Amanhã tentarei descrever-vos os sons do meu dia.

Poema do dia

Sei que parece imperdoável e talvez até o seja, mas a verdade é que sempre gostei deste poema sem saber quem o tinha escrito. Escutei-o pela primeira vez há muitos anos e desde então nunca mais o esqueci. Voltei a escutá-lo este fim de semana, cortesia de um amigo, que também me revelou o seu autor.

Resta-me guardá-lo entre as páginas desde "blog" e partilhá-lo com quem quiser lê-lo e senti-lo. A quem mo recordou, muito obrigada - é bom ter a certeza de que crescemos a cada dia que passa por nós.

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo ... e tudo errou...
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se enlaçou mas não voou...
Momentos de alma que, desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...


Quase, Mário de Sá Carneiro

António Gedeão


António Gedeão
@Citi

Afirmando-se como um dos mais brilhantes e talentosos criadores lusófonos do século XX, Rómulo de Carvalho/António Gedeão, respectivamente, o professor, pedagogo e historiador da ciência, e o seu alter-ego literário, atravessou todas as convulsões e acontecimentos marcantes do nosso século, que se reflectiram no formar-se de um espírito extremamente marcado pelo cepticismo e pela ironia, sempre presentes nos seus poemas.

Licenciado em Ciências Físico-Químicas pela Universidade do Porto em 1931, traduziu como ninguém, a ciência para os leigos, desvendando segredos científicos com a mesma simplicidade com que os exemplificava.

Lisboeta toda uma vida, uniu de forma exemplar, através da sua obra, a ciência e a poesia, a vida e o sonho. Apesar de só aos 50 anos ter decidido publicar o seu primeiro livro de poesia, inaugurando assim uma carreira que se afirmou por si própria na cultura portuguesa, tornou-se uma figura de referência incontornável no imaginário colectivo do povo português, principalmente para toda a geração da "Pedra Filosofal".

Poucos meses após ter celebrado o seu 90º aniversário, assinalado pela homenagem que lhe foi prestada pelo Ministério de Ciência e de Tecnologia, a sua morte em 19 de Fevereiro 1997, deixa-nos um legado para o futuro, numa sociedade cada vez mais global, onde a união entre Ciências e Humanidades se torna cada vez mais uma necessidade premente.

in C.I.T.I - Universidade Nova de Lisboa


António Gedeão, nasceu a 24 de Novembro de 1906. Entre a sua obra, contam-se alguns dos mais belos poemas da língua portuguesa, ensaios, obras de ficção, obras científicas, etc.

Meu pratinho de arroz doce
polvilhado de canela;
Era bom mas acabou-se
desde que a vida me trouxe
outros cuidados com ela.

Eu, infante, não sabia
as mágoas que a vida tem.
Ingenuamente sorria,
me aninhava e adormecia
no colo da minha mãe.

Soube depois que há no mundo
umas tantas criaturas
que vivem num charco imundo
arrancando arroz do fundo
de pestilentas planuras.

Um sol de arestas pastosas
cobre-os de cinza e de azebre
à flor das águas lodosas,
eclodindo em capciosas
intermitências de febre.

Já não tenho o teu engodo,
Ó mãe, nem desejo tê-lo.
Prefiro o charco e o lodo.
Quero o sofrimento todo,
Quero senti-lo, e vencê-lo.


António Gedeão, Dor de Alma

"A Ópera Mágica do Cantor Maldito"

Assim se chama o novo disco de Fausto. Depois de quase 10 anos de silêncio, confesso que já tinha saudades.

E para recordar, aqui fica uma das minhas canções preferidas.

O barco vai de saída
Adeus ao cais de Alfama
Se agora vou de partida
Levo-te comigo ó cana verde
Lembra-te de mim ó meu amor
Lembra-te de mim nesta aventura
P'ra lá da loucura
P'ra lá do Equador

Ah mas que ingrata ventura
Bem me posso queixar
da Pátria a pouca fartura
Cheia de mágoas ai quebra-mar
Com tantos perigos ai minha vida
Com tantos medos e sobressaltos
Que eu já vou aos saltos
Que eu vou de fugida

Sem contar essa história escondida
Por servir de criado essa senhora
Serviu-se ela também tão sedutora
Foi pecado
Foi pecado
E foi pecado sim senhor
Que vida boa era a de Lisboa

Gingão de roda batida
corsário sem cruzado
ao som do baile mandado
em terra de pimenta e maravilha
com sonhos de prata e fantasia
com sonhos da cor do arco-íris
desvaira se os vires
desvairas magias

Já tenho a vela enfunada
marrano sem vergonha
judeu sem coisa nem fronha
vou de viagem ai que largada
só vejo cores ai que alegria
só vejo piratas e tesouros
são pratas, são ouros,
são noites, são dias

Vou no espantoso trono das águas
vou no tremendo assopro dos ventos
vou por cima dos meus pensamentos
arrepia
arrepia
e arrepia sim senhor
que vida boa era a de Lisboa

O mar das águas ardendo
o delírio do céu
a fúria do barlavento
arreia a vela e vai marujo ao leme
vira o barco e cai marujo ao mar
vira o barco na curva da morte
e olha a minha sorte
e olha o meu azar

e depois do barco virado
grandes urros e gritos
na salvação dos aflitos
estala, mata, agarra, ai quem me ajuda
reza, implora, escapa, ai que pagode
rezam tremem heróis e eunucos
são mouros são turcos
são mouros acode!

Aquilo é uma tempestade medonha
aquilo vai p'ra lá do que é eterno
aquilo era o retrato do inferno
vai ao fundo
vai ao fundo
e vai ao fundo sim senhor
que vida boa era a de Lisboa


O barco vai de saída, Fausto

Amor ?


Lápide num cemitério

Chegou-me agora, por e-mail, esta linda prova de amor.
Ele há coisas...

23 novembro 2003

Ligação do dia

The Literature Network - um site com 300 livros completos online, mais de 1000 contos, mais de 8500 citações, pertencentes a 90 autores, entre os quais Dante Alighieri, Charles Dickens ou Oscar Wilde.

Vale a pena a visita.

22 novembro 2003

Foi há 40 anos


JFK


que se escreveu uma (mais uma) página negra, na história dos Estados Unidos da América. Foi assassinado John Fitzgerald Kennedy, supostamente por Lee Harvey Oswald. Até hoje, não se sabe ao certo porquê, nem a mando de quem.
As teorias são muitas, o resultado é conhecido - a morte do 35º presidente dos EUA.

Pois é...

ainda hoje se pagam os erros cometidos no passado e, ainda hoje, o passado pode fazer vítimas.

A autarquia de Milão, vai este fim de semana (amanhã), promover a desactivação de um engenho explosivo, encontrado recentemente num terreno daquela cidade. O engenho é apenas, e só, uma bomba de 450 quilogramas, que terá sido lançada durante a 2ª Guerra Mundial.
Para esta operação, com uma duração estimada em 10 horas, decorrer em segurança, as zonas vizinhas, num raio de 1 quilómetro serão evacuadas.

500 % ???

Eu também quero um aumento assim. Segundo o Correio da Manhã, o futebolista Miguel, pertencente aos quadros profissionais do Sport Lisboa e Benfica, renovou o seu contrato com o clube, passando a estar vinculado ao mesmo até 2008. Esta renovação foi possível devido a um aumento de 500% (quinhentos), passando a auferir a quantia de 50.000 € mensais.
Fica já aqui o apelo aos sindicatos deste país, para que nas rondas negociais com os representantes das entidades patronais, fincarem o pé e não se contentarem com menos do que isto: 500% de aumento.

O país está de tanga

Cada vez mais me convenço disso. Todos os dias na estrada, me cruzo, com pobres senhores, e algumas senhoras também, que realmente estão "nas lonas". Investiram milhares de euros num veículo topo de gama, de preferência Mercedes ou BMW mas, em virtude da crise económica que atravessamos, despojado de indicadores de mudança de direcção. Deus sabe que são caríssimos, e depois provavelmente não terão o devido uso, sendo preteridos à aquisição de um sistema de som dolby prologic ou de um ar condicionado automático, esses acessórios imprescindíveis que realmente fazem falta num veículo.

21 novembro 2003

Poema pessoano

Tudo o que faço ou medito
Fica sempre pela metade,
Querendo, quero o infinito.
Fazendo, nada é verdade.

Que nojo de mim me fica
Ao olhar para o que faco!
Minha alma é lúcida e rica,
E eu sou um mar de sargaço...

Um mar onde boiam lentos
Fragmentos de um mar de além...
Vontades ou pensamentos?
Não o sei e sei-o bem.


Fernando Pessoa, Tudo o que faço ou medito

Vai uma Margarita ??

Neste site podemos encontrar dezenas de receitas de cocktails, podendo inclusivé, seleccioná-los pela bebida principal.

[Infelizmente, não dispõe de receitas não-alcoólicas :-(( ]

Lembram-se de Thomas Crown ?


Le fils de l'homme

René Magritte, Le fils de l'homme

Este quadro inspirou de sobremaneira Thomas Crown, para a sua última jogada, no filme "Thomas Crown Affair", quando dezenas de homens vestidos de sobretudo e usando um chapéu de côco se cruzaram nos vários corredores do museu.
Foi pintado por René Magritte, um dos expoentes máximos do surrealismo. Lembrei-me dele hoje, porque nasceu há precisamente 105 anos, a 21 de Novembro de 1898. Podem consultar alguns dos seus quadros aqui.

Arte do dia


Poetry


Poesia , Alfons Mucha (1860-1939)

Para o Rui.

Mais um Natal

Morrer é um dia igual a outro qualquer, só que mais curto.
(António Lobo Antunes)

Vem aí mais um Natal. Chega a passos de gigante e eu já lhe sinto o sabor agridoce. Desde há 17 anos que é assim. Desde que a minha avó morreu que o Natal deixou de ser. Passou a existir apenas no calendário e nas lembranças raramente invocadas de tempos mais felizes, em que as coisas eram mais simples e o Pai Natal me batia à porta, madrugada dentro. Claro que eu sabia que não era o Pai Natal quem me visitava. Não é que eu fosse um prodígio, mas tinha descoberto, por acaso, os meus presentes escondidos debaixo da cama dos meus pais, meses antes do Natal...

Agora é tudo diferente. A minha mãe anda triste, chora às escondidas e sente-se desamparada, como se fosse ela própria uma criança. Vira-se para mim e para a minha irmã, frágil e dependente de nós. Abraço-me a ela e ela aninha-se no meu colo e faz-se mais pequena. Nessas altura penso que os papéis se inverteram e agora sou eu quem a ampara na tristeza e o colo que me deu abrigo, agora se abriga em mim. A diferença é que as minhas tristezas de criança eram raras e todas fáceis de resolver. A dela é permanente e não tem consolo ou solução possíveis e é nesta época que mais se faz sentir.

Quando morre alguém de quem gostamos, o choque deixa-nos dormentes. Velório, missas, funeral, pêsames, todo o cortejo obrigatório é irreal, como um filme que apenas somos capazes de pressentir. A verdadeira dor vem depois, mais tarde, quando a vida retoma o seu leito e nos arrasta para as mesmas rotinas, os mesmos rituais de sempre. É durante esses momentos que percebemos a falta, o buraco, o vazio que não podemos preencher. As lembranças físicas podem ser apagadas, pode-se tirar uma cadeira da mesa, uma almofada da cama, mas não se pode tirar um afecto nem substituí-lo ou escondê-lo – tirar de onde? Substituir por quê? Esconder de quem?

Um ano depois da morte da minha avó nasceu o meu sobrinho. É preciso que uns morram para que outros nasçam, digo-lhe eu. Mas a minha voz soa a vazio e logo me arrependo e penso “Que disparate!”. Tento trazê-la para a vida, para as pessoas que precisam dela e no fundo de mim sinto uma mágoa a crescer: será que a minha mãe gostava mais dos meus avós do que de mim e da minha irmã? Depois penso outra vez “Que disparate!”.

Fico à espera que passe mais um Natal como quem fica à espera que a chuva pare para poder continuar o caminho.

Apanhei...

...a primeira "molha" da temporada! Neste momento, escrevo descalça, com as botas a enxugar em cima do aquecedor, o cabelo a pingar e a roupa colada ao corpo (sexy, não?).

Se a quantidade monstruosa de vitamina C que tenho ingerido nos últimos tempos não me ajudar, amanhã devo estar com a primeira gripe deste Inverno :(

Mas porque é que eu não consulto o boletim metereológico?

Peter Pan


´Michael Jackson


(Michael Jackson em 1979, com 21 anos)

Das acusações de pedofilia e das excentricidades nem sequer vou falar, mas há uma coisa que me intriga no Michael Jackson: porque é que uma pessoa com tanto sucesso, com tanto dinheiro, com tantas possibilidades de ter uma vida agradável, escolhe passar tanto tempo em sofrimento, fazendo cirurgia atrás de cirurgia? Será vaidade? Negação da raça? Ou será uma outra forma, mais sofisticada e drástica, de auto-mutilação?

Greve

Hoje a Função Pública faz greve. Protesta-se contra os salários que não vão ter aumento em 2004, contra a nova lei das reformas e contra o novo sistema de avaliação dos funcionários.

Como funcionária pública devo dizer que não estou encantada com o facto de não ver aumentado o meu já gordo salário, mas não posso deixar de concordar, em princípio, com a avaliação por mérito dos funcionários. Governo e sindicatos são unânimes a afirmar que o sistema actual de progressão nas carreiras (através de concurso público) não funciona, então porque não tentar encontrar outras soluções?

Não simpatizo com este governo (na verdade, nunca simpatizei com nenhum e já disse o que penso sobre os políticos), mas também não acredito nos sindicatos. As pessoas que decidiram em consciência não fazer esta greve estão a ser olhadas de esguelha pelos colegas sindicalistas estacionados à porta e isso não me parece justo.

Além do mais, gosto especialmente de trabalhar em dias assim. Há menos gente, mais silêncio, trabalha-se melhor.

No dia em que me vinculei ao Estado, o meu chefe disse-me qualquer coisa como isto: "Agora que já tem a panela do cozido para toda a vida, não deixe de estudar, de progredir, de aprender. O que faz com que a Função Pública tenha má imagem é que as pessoas agarram-se ao facto de que nunca irão perder o emprego e deixam de se esforçar".

Foi um dos melhores conselhos que já recebi. Não deixei de estudar, de progredir, de aprender e, sobretudo, não deixei de acreditar que as coisas podem mudar.

NOTA: A menção ao meu "gordo salário", para quem não percebeu, era irónica!

20 novembro 2003

Poema do dia

Desarrezoado amor, dentro com meu peito,
tem guerra com a razão. Amor, que jaz
i já de muitos dias, manda e faz
tudo o que quer, a torto e a direito.

Não espera razões, tudo é despeito,
tudo soberba e força; faz, desfaz,
sem respeito nenhum; e quando em paz
cuidais que sois, então tudo é desfeito.

Doutra parte, a Razão tempos espia,
espia ocasiões de tarde em tarde,
que ajunta o tempo; em fim, vem o seu dia:

Então não tem lugar certo onde aguarde
Amor; trata traições, que não confia nem
nos seus. Que farei quando tudo arde?


Francisco Sá de Miranda (1481-1558)

Lisboa

Hoje, mais uma vez, realizei a minha rotina bimensal de ir á consulta de hipo-coagulação, com a sua inevitável análise. Entre o tempo que medeia entre uma e outra, aproveito para passear pela cidade de Lisboa a pé. É cansativo, é certo, principalmente porque tenho de estar sempre a desviar-me de carros (parados e em movimento) em cima do passeio e na estrada, para onde tenho de me desviar por vezes, mas é estimulante e compensador.
Passo três, quatro horas, avenida acima, avenida abaixo, travessa para a esquerda, beco para a direita. Entro num ou noutro café, bebo uma bica ou uma água, observo o que me rodeia.
Casas a cair, edifícios de escritórios espelhados, gente apressada de um lado para o outro. Um senhor que estava no Passeio Público, sentado num banco de jardim, acompanhado pelo seu cão, sentado também, em cima do banco, olhando impávido e sereno, o movimento das outras pessoas (dava uma bela fotografia, mas infelizmente deixei a máquina em casa). Vejo portugueses, indianos, chineses, imigrantes de leste, africanos, brasileiros, e outros povos que se cruzam dia a dia, num país que é de todos, e a todos pertence. Observo o comércio. Nas laterais da avenida, pequenos pólos parecem um mundo à parte. Habitações pertencentes a uma população mais idosa, que se conhece, que se trata por tu. As mercearias de esquina, os cafés, as associações culturais e os clubes de bairro, os reformados sentados, fumando o seu cigarro, conversando sobre o estado da nação, ou sobre a vitória do clube x ou y. Peças de roupa estendida nas varandas, ou no estendal.
O turbilhão de movimento matinal inicia-se após uma noite mais sossegada. A cidade não pára, entorpece por algumas horas, mas nunca, nunca chega a adormecer. Logo mais, tudo se repete.


Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores ...
À força de diferente, isto é monótono.
Como à força de sentir, fico só a pensar.

Se, de noite, deitado mas desperto,
Na lucidez inútil de não poder dormir,
Quero imaginar qualquer coisa
E surge sempre outra (porque há sono,
E, porque há sono, um bocado de sonho),
Quero alongar a vista com que imagino
Por grandes palmares fantásticos,
Mas não vejo mais,
Contra uma espécie de lado de dentro de pálpebras,
Que Lisboa com suas casas
De várias cores.

Sorrio, porque, aqui, deitado, é outra coisa.
A força de monótono, é diferente.
E, à força de ser eu, durmo e esqueço que existo.

Fica só, sem mim, que esqueci porque durmo,
Lisboa com suas casas
De várias cores.


Álvaro de Campos, Lisboa

Canção do Dia

Tribalistas, Velha Infância

Você é assim
Um sonho pra mim
E quando eu não te vejo

Eu penso em você
Desde o amanhecer
Até quando eu me deito

Eu gosto de você
E gosto de ficar com você
Meu riso é tão feliz contigo
O meu melhor amigo é o meu amor

E a gente canta
E a gente dança
E a gente não se cansa

De ser criança
Da gente brincar
Da nossa velha infância

Seus olhos meu clarão
Me guiam dentro da escuridão
Seus pés me abrem o caminho
Eu sigo e nunca me sinto só

Você é assim
Um sonho pra mim
Quero te encher de beijos

Eu penso em você
Desde o amanhecer
Até quando eu me deito

Eu gosto de você
E gosto de ficar com você
Meu riso é tão feliz contigo
O meu melhor amigo é o meu amor

E a gente canta
E a gente dança
E a gente não se cansa

De ser criança
Da gente brincar
Da nossa velha infância.


Para a Sónia

19 novembro 2003

Substantivos

que me incomodam solenemente:

- hipocrisia
- vaidade
- mentira
- desonestidade
- infidelidade

que por sua vez levam a outros substantivos, que ao envolverem-se com uns verbos, executam umas expressões populares, terminando tudo num imbróglio de palavras nada dignificantes para outro substantivo - carácter, de importância extrema, visto que nos classifica como Homens perante a sociedade a que pertencemos.

Grandes Enigmas I

"Clássico é clássico e vice-versa."

Jardel - ex-atacante do Grêmio, Porto, Galatasaray, quase Benfica, Sporting e actualmente anda algures por Inglaterra

Frases

"Ninguém jamais vencerá a guerra dos sexos: há muita confraternização entre os inimigos"
- epígrafe do livro "A Vingança de Eva", de Henry Kissinger

"Há dois tipos de pessoas: As que fazem as coisas, e as que dizem que fizeram as coisas. Tente ficar no primeiro tipo. Há menos competição".
- Indira Ghandi

"A fábrica do futuro terá apenas dois operários: Um homem e um cachorro.
Função do homem: alimentar o cachorro.
Funcão do cachorro: não deixar o homem tocar nas máquinas".
- Walter Block - Autor de Defending the Undefendable

"Existem dois modos de se refugiar das misérias da vida: música e gatos"
- Albert Schweitzer

"Os gatos são distantes, discretos, impecavelmente limpos e sabem calar. Falta mais alguma coisa para considerá-los uma excelente companhia?"
- Rainha Maria Leszcynska

Caro Azelha,

Antes de mais, muito obrigada pela sua visita e pelo seu comentário. O facto de eu não querer entrar em guerrilhas políticas na "blogosfera" não significa que não me mantenha informada sobre o que se passa em Portugal e no mundo. Vejo noticiários (excepto os da TVI, confesso), leio jornais, enfim mantenho-me a par dos assuntos "sérios", embora não partilhe com alguma imprensa a curiosidade mórbida pela dissecação de certos assuntos até à raíz do mau gosto e da pura especulação. Apenas não tenho qualquer filiação política porque nenhum partido corresponde aos meus ideais e, como disse e reafirmo, não acredito que neste momento existam políticos idealistas em Portugal. Creio que os objectivos pessoais há muito que devoraram os ideais sociais e por isso não nutro qualquer admiração por eles (os políticos) nem tão pouco acredito em promessas que, nos últimos tempos, mais parecem as histórias que a minha avó me contava para eu adormecer tranquila. Mas ouço o que dizem senão como poderia ter uma posição e opinar sobre o assunto?

E voto! Sempre votei, até nos referendos que tão desprezados foram, lembra-se? O facto de ser apartidária não significa que não tenha consciência social e noções elementares de cidadania.

Para terminar, deixe-me apenas que lhe diga que não concordo de todo com esta sua frase:(a política) mostra-nos a caminho para onde vamos e para onde não queremos ir . O meu avô - comunista, idealista, apaixonado e temerário – costumava dizer que cada homem constrói o seu próprio destino. Ele construiu o seu, sem dúvida, e por isso passou metade da vida a contrariar um regime político com o qual não concordava, assumindo os riscos e as consequências sempre de cabeça erguida. Nunca deixou de acreditar e defender aquilo em que acreditava.

Foi essa a sua herança para mim. Não o comunismo, que não posso subscrever, tal como não subscrevo nenhuma outra doutrina política, mas o ensinamento de que é preciso conhecer para poder escolher e assumir as nossas escolhas não com instransigência, mas com convicção.

Para mim, uma pessoa é mais do que a sua expressão social, é mais do que uma estatística ou um voto e nenhuma política, filosofia ou religião devem ditar e delimitar os nossos caminhos.

18 novembro 2003

Esquerda, direita, volver!

Confesso que tenho andado um pouco "blogofóbica" nos últimos dias. Sei que não devia, não por estas razões, mas não consigo evitar. Há coisas que me aborrecem - felizmente não são muitas - e que me fazem querer desistir. Mas depois penso nas razões pelas quais construí este Convento em conjunto com o João e tenho a certeza de que tenho mais razões para continuar do que para desistir.

A minha "blogofobia" tem a ver com política, esse bicho de mil cabeças e mil e uma faces que acaba por entrar na vida de toda a gente, mesmo de pessoas que, como eu não têm quaisquer ideiais, expectativas ou filiação política. Parece que, nos dias que correm, dizer que não me interesso por política é quase um crime. Pois bem, não me interesso de todo. Não acredito em política e muito menos em políticos. Acho que todas as pessoas envolvidas na cena política actual perderam quaisquer ideiais (se é que alguma vez os tiveram) e preocupam-se apenas com o benefício próprio.

Enfim, a questão é esta: a meu ver, a blogosfera está a ficar politizada, demasiado politizada para o meu gosto. Parece que falar de política, ter "ideias políticas" é muito adulto, muito de gente crescida e madura. E parece mais importante ainda definir as tendências de cada um, se mais à esquerda ou à direita. Assim, e para não voltar a falar em tal assunto que, volto a dizer, me aborrece de morte, aqui deixo aquilo em que acredito e quem quiser ler que me diga se sou de esquerda, direita, centro, pernas para o ar, esguelha, trás para a frente, etc.

Acredito...

que ninguém deve ser excluído pela sua raça, sexo, credo, nacionalidade ou convicções.
que todos merecem iguais direitos e deveres.
que ninguém deve ser ostracizado ou de alguma forma repreendido por dizer o que pensa.
que a liberdade individual consiste também em respeitar a liberdade alheia.
que uma sociedade apenas pode progredir com trabalho, e para tal deve contar com o esforço de todos os seus elementos.
que a fome, a doença, a miséria e o analfabetismo são as maiores chagas sociais, mas que não cabe apenas aos governos curá-las. Cada um de nós tem uma responsabilidade social e deve assumi-la sempre que necessário.
que qualquer sociedade deve proteger as suas crianças e os seus velhos.
que a criminalidade deve ser prevenida antes de ser punida.
que o respeito a este planeta e a todas as criaturas que connosco o partilham deve ser tão grande ou maior do que o respeito com que tratamos as nossas casas e as nossas coisas.
que nenhuma causa neste mundo vale a morte, nem que seja de uma só pessoa.

(...)

Only the gentle are ever really strong
(James Dean)

Arte em saldos! Desconto de 100%!

Um dia o meu ex-chefe disse-me: "Se gosta tanto de Arte Nova, então investigue os Pré-Rafaelitas, que foram os percursores". E foi o que fiz.


LadyofShalott


(Lady of Shalott, John William Waterhouse, 1888)

On either side the river lie
Long fields of barley and of rye,
That clothe the wold and meet the sky;
And through the field the road run by
To many-tower'd Camelot;
And up and down the people go,
Gazing where the lilies blow
Round an island there below,
The island of Shalott.


(Início do poema Lady of Shalott, Alfred, Lord Tennyson)

Parabéns


Mickey Mouse

O rato mais famoso em todo o mundo faz hoje anos. O Mickey apaga hoje 75 velinhas!
Que bem conservado está!

Canção do Dia

There was a real thin line
Between right or wrong
In those Walt Disney times
When my parents were young..
But the line has disappeared...
And you wonder where it hides....
And you wanna go out; but you stay inside.....

I got run over by truth one day
Didn't see the red light
Since the accident I've walked this way
- I only did what felt right...
But from this day on; it's either: grow or pay!
Grow or pay
'Coz I got run over by truth one day

Sometimes the sky's so grey
That you cannot see beyond it
And even the wildest of dreams
- Can't take those lines from your forehead
Yeah! I know there's a bill
- And it's gonna make it's way somehow
With and excuse and a bow; I'll be paying it now:

I got run over by truth one day
Didn't see the red light
Since the accident I've walked this way
- I only did what felt right...
But from this day on; it's either: grow or pay!
Grow or pay
'Coz I got run over by truth one day
Grow or pay
From this day on it's either: grow or pay
Grow or pay

Grow or pay
I got run over by the truth one day
And since the accident I've walked this way
Didn't see the red light
But from this day on; it's either grow or pay!

Grow or pay
'Coz I got run over by the truth one day...


Grow or pay, D.A.D. (do álbum Riskin' It All)

17 novembro 2003

O Grito


O Grito de  Edvard Munch

de revolta pelas vítimas da sinistralidade rodoviária.


Edvard Munch enriqueceu a pintura universal com a sua tela O Grito, que traduz o desespero humano, como se o silêncio agonizante de nossos corações reboasse num mundo de surdos. Na opinião de Fredric Jameson, a tela retrata os sintomas da "era da ansiedade" - a alienação, a anomia, a solidão, a fragmentação social e o isolamento. Ali, a figura humana não pode escutar seu próprio grito, pois não tem orelhas. Cercada pela natureza que faz eco ao horror, parece ter chegado ao fim da ponte que conduz a lugar nenhum.
in ALAI, América Latina en Movimiento

Ontem...

...na televisão falaram de um casal que fez setenta anos de casado. Eu e o João comentámos qualquer coisa como "Bolas! Setenta anos juntos! Mas quem é que aguenta?". E ao mesmo tempo, dávamos as mãos.

(...)

Tal como aconteceu aquando da Acção Leucemia, tive uma grande dificuldade em encontrar a abordagem mais correcta para falar desta questão, desta guerra civil como lhe chamam – infelizmente, a figura não podia ser mais apropriada. Se estamos demasiado próximos da causa, tendemos a ser apaixonados e arrebatados no discurso, se, pelo contrário, nunca fomos tocados por esta dor (embora não consiga imaginar alguém a quem o tema possa deixar indiferente), corremos o risco de ser demasiado distantes.

Até à data, não sofri nenhum acidente, nenhum dos meus familiares ou amigos passou por essa experiência. Já perdi pessoas queridas, mas não desta maneira estúpida, súbita, inexplicável. Nenhuma morte faz sentido e todas são inesperadas e brutais, mas perder alguém que se ama num acidente deve ser muito pior do que quaisquer palavras possam descrever.

Não me apetece dissertar sobre as causas dos acidentes nas estradas portuguesas. Mau estado das estradas? Talvez em alguns casos. Má vigilância e legislação branda e omissa? Sim, mas que raio de seres somos nós que precisam ser constantemente vigiados e sentir a Lei como uma ameaça em vez de uma protecção? Comportamento irresponsável por parte de alguns condutores? Sim, inclino-me mais para este motivo, embora não consiga perceber que gozo retiram algumas pessoas de desligar as luzes e acelerar por uma via pública em alta velocidade, ou andar em autoestradas em contra-mão, ou simplesmente acelerar o motor ao limite indiferentes ao facto de que não estão sozinhos na estrada.

A coisa mais parecida com uma explicação para estes casos foi dada há uns anos pelos realizador David Cronenberg no filme “Crash”. Um instinto, básico, primário, directamente ligado à libido, ao prazer e afirmação sexual. O ser mais do que o resto do mundo, ter a nossa vida e as vidas alheias nas mãos e sacrificá-las ou poupá-las conforme a nossa vontade. Será qualquer coisa parecida com isto? Talvez, mas hoje não importa falar dos assassinos, mas das vítimas. Dos que deixaram de viver, daqueles para quem a vida nunca mais pode ser igual e dos outros, os que não estavam no carro ou na rua, mas para os quais a vida terá sempre uma sombra de morte.

Por todos eles é nosso dever celebrar a vida, ontem, hoje e sempre no futuro. Celebrá-la cada vez que nos apetecer carregar um pouco mais no acelerador, porque estamos entediados, zangados ou simplesmente porque comprámos um carro novo e queremos explorá-lo e exibi-lo. Celebrar a vida pensando duas vezes antes de nos sentarmos ao volante depois de termos bebidos uns copos, apesar de nos sentirmos bem.

Há muito mais que gostaria de dizer mas não consigo. É difícil trocar sentimentos por palavras, fica-se sempre a perder.

(...)

O Alberto era doente renal crónico. Depois de anos de hemodiálise, conseguiu ser transplantado. Hoje vive bem com o rim que não lhe pertence, mas que lhe trouxe vida nova e a possibilidade de fazer coisas que antes lhe estavam proibidas. Lembro-me de uma noite em que fui visitá-lo e ele me mostrou vários álbuns de fotografias. Tinham sido todas tiradas em fins de semana, as 48 horas de liberdade que a doença lhe concedia, já que, devido à hemodiálise, não se podia afastar muito do hospital. Lembro-me da alegria nos olhos do Alberto enquanto me mostrava aquelas fotografias – eram os momentos em que era livre, saudável, normal. Naquelas alturas não dependia de nada ou de ninguém.

Depois das fotografias falámos das semanas no hospital e o Alberto disse-me uma coisa que nunca irei esquecer. Disse-me que havia três épocas no ano em que os doentes à espera de transplante ganhavam nova esperança: Páscoa, férias e Natal. Referia-se aos acidentes de viação que ocorrem em maior número nessas épocas. Primeiro senti-me chocada. Como pode um ser humano ter esperança na morte de outro? Depois compreendi e hoje compreendo melhor do que nunca.

O Alberto soube quem foi o seu dador. Um rapaz de 18 anos que sofreu um acidente de mota. Excesso de velocidade. Nunca o esquece, tenho a certeza. Nessa noite, falámos dele também, doador involuntário de vida que nunca conhecemos, mas que estava ali tão presente como nós.

16 novembro 2003

Dia Europeu em Memória das Vítimas de Acidentes Rodoviários III

Aos 16 anos pediu ao pai para lhe comprar uma motorizada. Queria ter uma. Não lhe fazia falta, era apenas para gozo pessoal. O pai negou-lha, porque era perigoso, e depois, porque não lhe fazia qualquer falta.

Passados dois anos, aos 18, fez o exame para a atribuição da Licença de Condução para Velocípedes com motor. Pediram-lhe que fizesse a trajectória de um oito e que identificasse 4 ou 5 sinais de trânsito, dos mais conhecidos e passaram-lhe a licença.

Como queria começar a trabalhar de dia e estudar à noite, o pai fez-lhe então a vontade: comprou-lhe uma acelera, uma Yahama CT 50 S (Supersport), novinha, vermelha, linda. A mãe ficou preocupada, o pai alertou para o perigo. Cerca de 8 meses antes, o tio tinha morrido de acidente de mota.

Os meses foram passando, algumas quedas aconteceram, um embate contra um automobilista que teimou em não parar num STOP, nada de mais, nada de grave.

No dia 28 de Abril de 1992, cerca de 6 meses depois da compra, vendo que o seu colega de trabalho não aparecia e que começava a fazer-se tarde, acabou de beber o seu café, e agarrando na acelera fez-se ao caminho. Não chegou a fazer 500 metros. Numa curva descendente, e após espreitar, acelerou a fundo e tentou ultrapassar um autocarro.

Não viu o carro que vinha em sentido contrário. Quando deu por ele, já era tarde demais. Tentou desviar-se para um descampado do seu lado esquerdo, mas que atitude estúpida!... Seria para aí que o carro se iria desviar. Deu-se um embate frontal. Foi cuspido, partiu com as pernas o guiador da acelera, foi contra o pára-brisas da viatura, passou por cima da mesma e estatelou-se no chão, a cerca de 10 metros do local do acidente.

Seguiu-se o pânico. Não, não tinha morrido. Nem sequer chegou a perder os sentidos, embora tenha estado lá perto. Juntaram-se várias pessoas, chegou a ambulância. O sangue escorria-lhe pela cara. Apesar de usar um capacete integral (todo fechado), sofreu diversos cortes. Mas o que preocupava não era isso. A perna direita estava virada ao contrário... literalmente. Não se via sangue, apenas se via a perna virada para fora, completamente torcida.

O pessoal da ambulância tomou os cuidados necessários para o transporte, tala na perna, pensos, colar, e fizeram-se à estrada. Chegado à urgência do hospital de Sta. Maria, percebeu que não iria para casa com a perna engessada como esperava.
-Foi de mota ??
-Sim.
-Vocês não têm juízo. Antes de comprar essas porcarias deviam ir a Alcoitão ver o que se passa lá.

Engoliu em seco, e viu a radiografia da sua perna. O fémur, apenas o osso maior e mais resistente do corpo humano, estava partido em dois sítios, tendo o intervalo entre as fracturas, de alguns centímetros, quase que desaparecido, restando apenas pequenos pedaços. Parecia que o osso que existira ali se tinha desintegrado.
-Vais ter de ser operado.

Chorou. Era a primeira vez que seria operado a alguma coisa. Como a equipa de banco só operava às 3ªs feiras, esperou quase um mês pela cirurgia. As dores, os nervos por vezes insuportáveis, eram combatidos com Valium, Xanax e muitos, muitos analgésicos por via endovenosa. A posição, com a perna sob tracção, levantada, engessada, com um ferro a atravessar o osso, perto do joelho, para manter o comprimento do fémur e evitar um início de calcificação fora do sítio, era díficil de suportar. Mas teve de o ser.

Foi operado a 27 de Maio de 1992. Correu bem. Colocaram-lhe uma cavilha no interior do osso, desde o colo do fémur até ao joelho. Iniciou-se então o período mais difícil. Duas semanas depois da operação, saiu do hospital de Sta. Maria, directamente para o Hospital da CUF onde iria ser seguido e onde faria a recuperação e a fisioterapia. Atendido por um médico de clínica geral, foi-lhe dito que o que lhe fizeram em Sta. Maria não estava bem feito. Provavelmente teriam de tentar outro método. Mas, antes de qualquer medida, devia ir lá outra vez no dia seguinte para ser atendido por um ortopedista. E assim foi... no dia seguinte apresentou-se novamente na CUF, de lágrimas nos olhos e ansioso pelo veredicto. O Dr. Ricciardi, o ortopedista, disse que na sua opinião a equipa de Santa Maria tinha feito um excelente trabalho e estava convicto de que tudo ia correr bem.

Iniciou logo no dia seguinte, a fisioterapia de modo a recuperar os movimentos, a força e a massa muscular. O joelho praticamente não dobrava. A perna mantinha-se quase direita. Logo no primeiro tratamento, fartou-se de morder uma ligadura, enquanto as lágrimas lhe escorriam pela cara. Ele deitado de barriga para baixo. A fisioterapeuta, sentada em cima dele, a agarrar-lhe na perna e a puxá-la, provocando dores horríveis. Logo na primeira sessão quis desistir. Não estava para sofrer mais. Preferia ficar assim, com a perna presa direita a ter de passar por aquilo outra vez. Mas passou. Passou por aquilo e muito mais.

Em Dezembro, 8 meses depois, voltou a pisar o chão, primeiro apoiado apenas por uma canadiana, depois, em Janeiro pode finalmente largar tudo e voltar a andar com as suas duas pernas.

Em Maio de 1993, foi novamente operado para que lhe fosse retirada a cavilha e tudo se repetiu. Mas, desta vez, tudo foi muito mais rápido e em dois meses a situação ficou resolvida.

Esta história apesar de tudo acabou bem. Nem todas acabam assim. Apesar de ter sofrido - e acreditem que sofri bastante - fiquei vivo para contar a história e praticamente sem sequelas, se descontarmos uma cicatriz na anca.

Dia Europeu em Memória das Vítimas de Acidentes Rodoviários II

Por vezes, quando desço a escada do prédio onde moram os meus pais, ao passar pelo 1º direito, vem-me um cheiro a torradas. Não umas torradas quaisquer, mas torradas feitas com pão alentejano, bem tostadas. Ainda me lembro do barulho da faca a raspar o excesso de queimado, para logo a seguir encher ambos os lados de manteiga que se derretia e escorria para o prato. Tenho esta lembrança desde pequeno. Desde que me lembro. Cresci naquele prédio. Os vizinhos eram como família.

No 1º andar direito, moravam a Alice e a Marta, mãe e filha. A Alice era uma senhora alentejana, muito bem disposta, sempre alegre. A Marta é da minha idade, andámos juntos na escola, fomos nomeados namoradinhos de infância. Por vezes, eu, a Marta, a minha mãe e a Alice saíamos. Íamos passear. No Verão íamos até à mata de Benfica, ou passear pelos campos floridos da Venda Nova (quando ainda eram campos e quando ainda eram floridos). Muitas vezes, de manhã, após as compras, acabávamos em casa da Alice a beber café com leite e a comer aquelas torradas deliciosas, cujo cheiro se entranhou na minha memória.

O pai da Marta, morreu quando tínhamos 14 anos. As duas irmãs casaram e saíram de casa. Naquela casa, viviam apenas as duas, mãe e filha. Uma completava a outra, uma fazia companhia à outra. Passaram-se anos assim. Eu e a Marta crescemos, as nossas mães amadureceram, os nossos laços mantiveram-se.

Um dia, ao chegar a casa, vindo do trabalho, a minha mãe com os olhos húmidos diz-me que a Alice morreu. Não quis acreditar. A Alice transmitia saúde a quem a visse. Como poderia ter morrido? Mas morreu. Não de doença, mas devido à incúria de um automobilista. Morreu, sem qualquer aviso, atropelada numa passadeira para peões quando chegava a casa após mais um dia de trabalho. Atropelada, arrastada alguns metros, numa rua a subir e com bastante inclinação, por um condutor distraído. Morreu ali. O condutor, nem sequer tinha seguro...

A Marta ficou sozinha, apoiada pelas irmãs, pelos vizinhos, pelos amigos.

Quando o cheiro de torradas paira no ar, penso na Alice e na sua morte...

Dia Europeu em Memória das Vítimas de Acidentes Rodoviários I

Hoje, dia 16 de Novembro, a Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados, evoca o Dia Europeu em Memória das Vítimas de Acidentes Rodoviários. Neste dia vai ser deposta uma coroa de flores, junto ao Monumento aos Mortos da Grande Guerra, na Avenida da Liberdade em Lisboa, pela 11 horas, prestando assim uma homenagem aos milhares de mortos da grande guerra civil que todos os dias se trava nas estradas portuguesas.

Todos nós já convivemos de perto com este flagelo que é a sinistralidade, através de familiares, amigos, conhecidos ou até através de nós próprios. Eu considero que as vítimas de um acidente rodoviário não são apenas as vítimas mortais. São também as suas famílias. São também aqueles que não morrendo, ficam de alguma forma afectados pelo acontecimento. A sinistralidade rodoviária é um problema social, é um problema de todos nós. Todos somos potenciais candidatos a ser mais um número na estatística. A consciencialização de todos tem de ter origem em cada um de nós.


Dia Europeu da Memória das Vítimas de Acidentes Rodoviários

15 novembro 2003

Mais arte, porque hoje é Sábado


Jardim das Delícias




Hyeronimus Bosch, Jardim das Delícias.

A primeira vez que vi este quadro foi há 16 anos, na capa do Conhecimento do Inferno de António Lobo Antunes, o primeiro livro de Lobo Antunes que li. A imagem intrigou-me tanto quanto o livro e resolvi investigar ambos os autores.

Na altura, pensei que Bosch era um surrealista do séc. XX e quando descobri que tinha vivido nos sécs. XV e XVI, fiquei bastante surpreendida. Nas obras de Bosch, tal como na escrita de Lobo Antunes, há qualquer coisa de muito forte que atrai e ao mesmo tempo repele, que maravilha e horroriza mas que nunca deixa espaço à indiferença.

Arte do dia


A Virgem, o Menino e Santa Catarina de Alexandria


Peter Paul Rubens, A Virgem, o Menino e Santa Catarina de Alexandria.

Desenho do Dia


The Vitruvian Man

Leonardo da Vinci, The Vitruvian Man

Este desenho feito por Leonardo Da Vinci, também conhecido como "Le proporzioni del corpo umano secondo Vitruvio", ilustrava a obra de Luca Pacioli - matemático e professor em FLorença, de nome "De Divina Proportione".
Será talvez um dos desenhos de Da Vinci mais conhecidos em todo o mundo. Os pensadores renascentistas viam no corpo humano uma perfeição matemática. Esta imagem representa o corpo humano inserido na forma ideal do círculo e nas perfeitas proporções do quadrado.

14 novembro 2003


Peace on Earth



Pablo Picasso, "Paz na Terra"

Milagre?

Devo confessar que apesar de ter tido uma educação católica apostólica romana, com direito a 1ª comunhão e tudo, me afastei da Igreja. Não posso, nem consigo estar de acordo com muitas das suas regras, e ou imposições.

Actualmente, e apesar de ter fé nalguma coisa, nalgum ser, seja o que for, que nos transcende, não sigo nenhuma fé imposta por qualquer religião. Sinto-me bem numa igreja, gosto de ir a uma quando preciso de desabafar para o vazio, quando quero estar um pouco só, quando preciso de calma e silêncio.

Isto vem a propósito, de um artigo, para o qual o Fernando chama a atenção, em que o Ministro de Estado e da Defesa, atribui a Nossa Senhora de Fátima a ajuda na crise que se abateu sobre a península no caso do petroleiro Prestige. Apesar de gostar de Fátima, e aceitar o seu culto, condeno veemente o comércio que por lá se faz, e tudo o que creceu em volta do culto mariano. Não ponho em causa as aparições, nem a fé por Nossa Senhora, embora pessoalmente possa ter algumas (poucas) reservas sobre como tudo se passou e o empolamento de que foi alvo. Há coisas que simplesmente não têm explicação racional. O que se segue é uma delas.

Eu nunca fui muito de acreditar em milagres, mas admito a sua existência, é como diz o povo, "eu não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem". Há cerca de 5 anos, após um despiste, o meu carro foi alvo de uma grande reparação que envolveu toda a parte dianteira do veículo. Por essa altura, a minha avó, resolveu juntar toda a família e oferecer o almoço, num ponto intermédio, Fátima. De vários pontos do país, sairam os vários familiares. De Lisboa, saí eu, mais um primo e um tio, cada um no seu carro, cada um com o carro cheio. No caminho para Fátima, várias vezes o limite máximo de velocidade não foi respeitado, atingindo por vezes, velocidades bastante mais elevadas (160-170 km/h) que o permitido por lei. Tudo correu bem. Almoçámos, passeámos um pouco pelo Santuário, e no fim do dia preparámo-nos para regressar.

Logo, ao sair de Fátima, na curva de acesso à A1, sinto o carro a "fugir", e a roda dianteira direita a abrir completamente para o lado de fora. Parei imediatamente, ia talvez a 20-30 Km/h. Como sabem as curvas de acesso às auto-estradas costumam ser bastante acentuadas. Chamei o reboque e após terem dado uma olhadela, descobriram logo o problema. Faltava o parafuso que sustenta a rótula da direcção e que segura a roda ao eixo da direcção, permitindo o seu movimento consoante o movimento que se imprime no volante. A roda, após a rótula ter saltado do seu sítio, apenas ficou segura pela transmissão.

O que até hoje ainda me faz impressão e transmite um arrepio frio... é que ... E se isto acontecesse quando íamos para Fátima ? Áquela velocidade, naquelas curvas, naquele piso "tão certinho", se a rótula se tem desencaixado... eu teria de certeza capotado, embatido nos rails, eu sei lá mais o quê, tendo como resultado algo que não quero sequer imaginar. Mas não aconteceu. Parece que estava segura, por algo ou alguém, durante o caminho para aquele lugar.

Foi milagre ? Obra do acaso ? Não sei. Mas como não acredito em coincidências, prefiro manter a dúvida.

António Aleixo

Vila Real de Santo António, vai hoje, a partir das 22 horas homenagear o seu poeta popular, António Aleixo. Entre as comemorações, vai haver uma exposição e um café-teatro sobre a vida deste poeta, que foi operário, tecelão, polícia, cauteleiro e emigrante em França, entre outras coisas. Aleixo faleceu 16 de Novembro de 1949. Os seus poemas foram recolhidos por Joaquim Peixoto de Magalhães e publicados com o título de Este Livro Que Vos Deixo, em 1969.


Sei que pareço um ladrão ...
mas há muitos que eu conheço
que, sem parecer o que são,
são aquilo que eu pareço.

Para não fazeres ofensas
e teres dias felizes,
não digas tudo o que pensas,
mas pensa tudo o que dizes

Muito contra o meu desejo,
sem lhe qu'rer dizer porquê,
finjo sempre que não vejo
quem finge que me não vê ...

Veste bem, já reparaste?
mas ele próprio ignora
que, por dentro, é um contraste
com o que mostra por fora

Eu não sei porque razão
certos homens, a meu ver,
quanto mais pequenos são
maiores querem parecer.

Uma mosca sem valor
poisa, c'o a mesma alegria,
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.

P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem que trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.


António Aleixo

13 novembro 2003

Cansados vão os corpos para casa
dos ritmos imitados de outra dança
a noite finge ser
ainda uma criança
de olhos na lua
com a sua
cegueira da razão e do desejo

A noite é cega e as sombras de Lisboa
são da cidade branca a escura face
Lisboa é mãe solteira
amou como se fosse
a mais indefesa
princesa
que as trevas algum dia coroaram

Não sei se dura sempre esse teu beijo
ou apenas o que resta desta noite
o vento enfim parou
já mal o vejo
por sobre o Tejo
e já tudo pode ser tudo aquilo que parece
na Lisboa que amanhece

O Tejo que reflecte o dia à solta
à noite é prisioneiro dos olhares
ao cais dos miradouros
vão chegando dos bares
os navegantes
amantes
das teias que o amor e o fumo tecem

E o Necas que julgou que era cantora
que as dádivas da noite são eternas
mal chega a madrugada
tem que rapar as pernas
para que o dia não traia
Dietrichs que não foram nem Marlenes

Não sei se dura sempre esse teu beijo
ou apenas o que resta desta noite
o vento enfim parou
já mal o vejo
por sobre o Tejo
e já tudo pode ser tudo aquilo que parece
na Lisboa que amanhece

Em sonhos, é sabido, não se morre
aliás essa é a única vantagem
de, após o vão trabalho
o povo ir de viagem
ao sono fundo
fecundo
em glórias e terrores e venturas

E ai de quem acorda estremunhado
espreitando pela fresta a ver se é dia
a esse as ansiedades
ditam sentenças friamente ao ouvido
ruído
que a noite, a seu costume, transfigura

Não sei se dura sempre esse teu beijo
ou apenas o que resta desta noite
o vento enfim parou
já mal o vejo
por sobre o Tejo
e já tudo pode ser tudo aquilo que parece
na Lisboa que amanhece


Sérgio Godinho, Lisboa que Amanhece)


Gosto tanto desta canção! Lembra-me Lisboa, a minha querida cidade, naquele momento, mesmo antes de amanhecer, em que o ar fica mais frio e mais leve, o mundo parece que pára para respirar fundo e preparar-se para um novo dia e o céu despede-se da noite em silêncio e com um sorriso de fogo, que se rasga num rosto de nuvens.

Lembra-me o Alto de Santa Catarina,
o miradouro de Santa Luzia,
o Cais do Sodré e o cacau da ribeira bebido lentamente, ao longo do rio,
um cacilheiro que se aproxima de terra,
a primeira janela de Alfama que se acende.

Lembra-me todos os lugares que eu amo com um amor maior em duas horas do dia: o anoitecer e o amanhecer. Por qualquer razão, estes sempre foram momentos mágicos para mim.

Arte do dia


Mother and Child

Ao olhar para as paredes do meu Convento, achei que lhes fazia falta um pouco de cor, de arte, de vida, enfim. Assim, decidi que, a partir de hoje, irei começar a pendurar aqui alguns dos meus quadros favoritos e não só, também vou espalhar por aí umas esculturas, por isso cuidado com as razantes, sim?

A vantagem de este Convento ser um lugar virtual é que nunca ficará demasiado cheio, tudo o que eu quiser ficará bem e eu poderei ser dona de algumas das peças mais caras da história da Humanidade.

Quanto às obras expostas, podem tocar-lhes, cheirá-las, abraçá-las, absorvê-las o quanto quiserem e até levá-las para casa porque são completamente gratuitas - aqui, pelo menos...

Para começar, este é um dos meus preferidos, "Mãe e Filho" de Gustav Klimt. Gostaria de dedicá-lo aos meus amigos Rui e Fernando, porque já percebi que partilhamos este gosto.

...E, já agora, para a Jacky também (juro que não foi plágio!)

I can fly!


I'm Flying!!!

O Irmão Fernando mandou-me este presente. Sou eu a voar! Estou tão contente! Obrigada, Irmão!

Last Kiss

Where, oh where, can my baby be?
The Lord took her away from me
She's gone to heaven, so I've got to be good
So I can see my baby when I leave this world

We were out on a date in my daddy's car
We hadn't driven very far
There in the road, straight ahead
A car was stalled, the engine was dead

I couldn't stop, so I swerved to the right
I'll never forget the sound that night
The screamin tires, the bustin glass
The painful scream that I heard last

Oh where, oh where, can my baby be?
The Lord took her away from me
She's gone to heaven, so I've got to be good
So I can see my baby when I leave this world

When I woke up the rain was pourin down
There were people standin all around
Something warm flowing through my eyes
But somehow I found my baby that night

I lifted her head, she looked at me and said
'Hold me darling, just a little while'
I held her close, I kissed her our last kiss
I found the love that I knew I had missed

Well now she's gone
Even though I hold her tight
I lost my love, my life, that night

Oh where, oh where, can my baby be?
The Lord took her away from me
She's gone to heaven, so I've got to be good
So I can see my baby when I leave this world


Pearl Jam

12 novembro 2003

(...)

You are the reason I am. You are all my reasons.

("A Beautiful Mind", 2001)

As Rosas de Atacama

No início do seu livro As Rosas de Atacama, Luis Sepúlveda fala da viagem que fez ao campo de concentração de Bergen Belsen, no rasto de Anne Frank. Em vez da sepultura de Frank, descobriu a seguinte frase, gravada na pedra: "Eu estive aqui e ninguém contará a minha história".

Esta frase serviu de mote ao livro que é uma colecção de histórias reais, testemunhos de vidas e feitos, pessoas e acontecimentos não necessariamente famosos, mas sempre inesquecíveis.

Todos nós temos as nossas Rosas de Atacama, histórias que merecem ser contadas, memórias que perduram além do tempo e não se deixam prender nas redes do espaço, lendas, feitos, discursos, ideias, poemas, canções, experiências, sentimentos, recordações, enfim, um livro de recortes muitas vezes perceptível apenas para quem o vai acrescentando vida fora.

Ontem, ao reler este livro ocorreu-me que é precisamente isso que temos vindo a fazer neste blog. Não temos um tema de fundo, não existe qualquer linha editorial, cada um de nós guarda nestas páginas virtuais alguma coisa que o marcou, apenas por um momento ou para sempre, mas cujo eco perdura.

Se este blog nascesse hoje, chamar-se-ía assim, Rosas de Atacama. Mas o nome não é o mais importante. O que interessa é que não há uma letra, uma imagem aqui presentes que não tenham um significado para quem deste lado as escreve ou edita. Este Memorial do Convento é um pedaço de nós. Saber que desse lado estão pessoas que nos visitam e que de alguma forma se identificam o que aqui encontram, é a melhor de todas as recordações que guardaremos desta fase das nossas vidas.

.

Momento imperceptível,
Que coisa foste, que há
Já em mim qualquer coisa
Que nunca passará?

Sei que, passados anos,
O que isto é lembrarei,
Sem saber já o que era,
Que até já o não sei.

Mas, nada só que fosse,
Fica dele um ficar
Que será suave ainda
Quando eu o não lembrar.


Fernando Pessoa, Momento Imperceptível

Poema do dia

Eis o poema que queria colocar ontem, na sequência do que escrevi sobre sexualidades, mas que não conseguia encontrar. O meu amigo Fernando enviou-mo ontem à noite.

Apesar do atestado de destrambelhamento internético que me passaste, muito obrigada Fernando!

É necessário amar,
qualquer coisa ou alguém;
o que importa é gostar
não importa de quem.

Não importa de quem,
nem importa de quê;
o que importa é amar
mesmo o que não se vê.

Pode ser uma mulher,
uma pedra uma flor,
uma coisa qualquer
seja lá o que fôr.

Pode até nem ser nada
que em ser se concretize,
coisa apenas pensada,
que a sonhar se precise.

Amar por claridade,
sem dever a cumprir;
uma oportunidade
para olhar e sorrir.

Amar como o homem forte
só ele sabe e pode-o;
amar até á morte,
amar até ao ódio.

Que o ódio, infelizmente,
quando o clima é de horror,
é forma inteligente
de se morrer de amor.


António Gedeão, Amor Sem Tréguas

(...)

Só é digno de ser amigo de alguém quem de si próprio é amigo (...)

Luís de Sttau Monteiro, Felizmente Há Luar!

Canção do Dia

Now that she's back in the atmosphere
With drops of Jupiter in her hair, hey, hey
She acts like summer and walks like rain
Reminds me that there's time to change, hey, hey
Since the return from her stay on the moon
She listens like spring and she talks like June, hey, hey

Tell me did you sail across the sun
Did you make it to the Milky Way to see the lights all faded
And that heaven is overrated

Tell me, did you fall for a shooting star
One without a permanent scar
And did you miss me while you were looking for yourself out there

Now that she's back from that soul vacation
Tracing her way through the constellation, hey, hey
She checks out Mozart while she does tae-bo
Reminds me that there's room to grow, hey, hey

Now that she's back in the atmosphere
I'm afraid that she might think of me as plain ol' Jane
Told a story about a man who is too afraid to fly so he never did land

Tell me did the wind sweep you off your feet
Did you finally get the chance to dance along the light of day
And head back to the Milky Way
And tell me, did Venus blow your mind
Was it everything you wanted to find
And did you miss me while you were looking for yourself out there

Can you imagine no love, pride, deep-fried chicken
Your best friend always sticking up for you even when I know you're wrong
Can you imagine no first dance, freeze dried romance five-hour phone conversation
The best soy latte that you ever had . . . and me

Tell me did the wind sweep you off your feet
Did you finally get the chance to dance along the light of day
And head back toward the Milky Way


Train, Drops of Jupiter

Vinha a ouvir a Best Rock hoje de manhã (como sempre, aliás) e passaram esta música. Gosto.

11 novembro 2003

The birth

"Below the skin of history are London’s veins. These symbols, the mitre, the pentacle star, even to someone as ignorant and degenerate as you, can sense that they course with energy... and meaning.
I am that meaning.
I am that energy.
One day, men will look back and say that I gave birth to the 20th Century."


atribuído a Jack, The Ripper

(...)

Meus caros,

Queria colocar aqui um poema de António Gedeão que diz qualquer coisa como isto: "É preciso amar, não importa o quê", mas não consegui encontrá-lo. Se algum de vós tiver esse poema, por favor envie-mo. Obrigada!

Caros blogonautas,

Ultimamente neste blog tem sido frequente encontrar termos como "rotos", "abichanados" ou "apaneleirados", regra geral trocados carinhosamente entre os membros do Bando do Agasalho. Hoje, o abade João escreveu sobre o José Castelo-Branco (essa musa inesgotável!), onde insinuou a homossexualidade do referido senhor. Por tudo isto creio que será importante fazer o seguinte esclarecimento.

O Memorial do Convento é um blog liberal, aberto a toda a gente, independentemente de raça, credo, convicções políticas ou religiosas e inclinações sexuais. Na tradição do Direito de Santuário medieval, segundo o qual todos tinham protecção garantida na casa de Deus sem que lhes fossem feitas quaisquer perguntas, também aqui todos são bem vindos desde que respeitem este espaço e as outras pessoas que o frequentam.

Eu e o João temos amigos homossexuais e conhecemos o "meio" (peço desculpas pelos termos que vou usar. Admito que não são os mais correctos, mas são os mais facilmente compreensíveis) e é nosso dever esclarecer que nunca fomos mal recebidos, olhados "de lado" ou tratados de forma "diferente" pelo facto de sermos um casal "hetero".

A nosso ver, não existe uma sexualidade correcta, natural ou normal. Existem sexualidades que devem ser plenamente vividas e assumidas sem medos, sem recriminações e falsas virtudes ou pudores e que todos devemos respeitar.

As pessoas valem por aquilo que são, pelas qualidades e talentos com que dia a dia nos deslumbram e isso não depende das escolhas ou preferências sexuais de cada um. Amar e ser amado são as coisas mais importantes deste mundo e é indiferente se esse amor é vivido com alguém do mesmo sexo ou de sexo diferente do nosso.

O "mundo" gay não é mais nem menos promíscuo do que o "mundo" heterossexual, simplesmente, por ser mais restrito do que este, há situações que se tornam mais evidentes. Ser gay não é um vício, não é um mal, não é uma aberração da natureza e certamente não é uma doença. É uma característica, tal como ser homem ou mulher, preto, branco, amarelo ou vermelho, alto, baixo, gordo ou magro, loiro, moreno ou ruivo. Não é a sexualidade que define se alguém é boa ou má pessoa.

Pessoalmente acredito que todos nascemos bissexuais. Pessoalmente admito que sou sensível à beleza feminina tanto quanto à masculina. Pessoalmente admito que seria capaz de manter um relacionamento com uma mulher. Pessoalmente assumo que sou alérgica ao preconceito e que este preconceito em particular, e a par do racismo, me revolta especialmente.

Por tudo isto, se qualquer palavra ou expressão usadas neste blog alguma vez magoaram alguém, peço-vos que aceitem as nossas sentidas desculpas. Nunca foi essa a nossa intenção.

Muito obrigada pela vossa atenção e pelas vossas visitas.

Grandes farras I

Foi a noite mais divertida que já passámos na prisão

(João Braga Gonçalves, séc. XXI, preso preventivamente no âmbito do processo da Universidade Moderna. O comentário em questão foi alusivo à noite em que José Castelo-Branco ficou detido nas mesmas instalações. Moral da história: ter um artista por perto, tráz sempre alguma alegria)

Fome

Podem falar-me de civilização, de democracia, de avanço tecnológico, das merdas que quiserem.
Mas eu sei que onde há fome, não há liberdade.


Como eu concordo contigo Fernando.

Sátira

Hoje, estive quase, quase a cometer uma falta terrível. Lembram-se quando o humorista Herman José viu ser-lhe suspenso o programa "Humor de Perdição", em virtude de ter nas suas entrevistas históricas, caracterizado o Infante D. Henrique como homossexual, ou o poeta Fernando Pessoa, como tarado sexual ?

Eu, estive quase a cometer o mesmo erro e arriscar-me-ia a ser suspenso de funções no Memorial.
Estive quase a fazer uma sátira com o José Castelo-Branco, caracterizando-o como heterossexual.

O «Verão» de S. Martinho

O dia de S. Martinho comemora-se no dia 11 de Novembro (hoje).

Segundo a lenda, um cavaleiro, Martinho, ao fazer a sua ronda durante uma tempestade, encontra um mendigo quase nu, a sofrer sob o frio e a chuva que se faziam sentir. Martinho, agasalhado com a sua manta, não pensou duas vezes, e com a sua espada cortou a manta em duas, oferecendo metade ao mendigo para se proteger.
Deus, ao ver isto, e enleivado com tamanha atitude de bondade, parou a tempestade e abriu o sol.

Desde essa altura, estes dias, denominam-se Verão de S. Martinho - que nem sempre são de Verão - e, faz-se a prova do vinho novo, acompanhado de suculentas castanhas ( espanholas, claro está).

10 novembro 2003

(...)

You can break a man's skull. You can arrest him. You can throw him into a dungeon. But how do you fight an idea?

("Ben-Hur", 1959. Argumento de Karl Tunberg - um dos raros casos em que a adaptação ao cinema de uma obra escrita consegue ser superior ao livro.)