30 março 2007

Dizem que a família não se escolhe mas é mentira. Nascemos de uma família, mas podemos ir formando outra, muito mais nossa, ao longo da vida. O sangue não é mais forte do que os afectos.

Uma colega dizia-me há pouco que seria incapaz de adoptar uma criança porque nada pode superar o amor que tem pelo filho que gerou e que viu sair-lhe do corpo. Eu perguntei-lhe se ela saberia a diferença caso a tivessem adormecido durante o parto e lhe tivessem posto ao lado uma criança que não fosse a dela. Ela não soube responder.

Imagino que estas coisas sejam diferentes de pessoa para pessoa e que cada um se prenda aos outros com laços diferentes. Para mim, o sangue, as semelhanças físicas, o código genético não significam nada porque o afecto tem a forma que lhe quisermos dar.

19 março 2007

O Drama, a Tragédia, o Horror...

Este fim de semana resolvemos ir apanhar um pouco de sol e aproveitar o bom tempo que se fez sentir em Lisboa. No sábado, após o almoço, dirigimo-nos para o Parque das Nações. Estacionamos (o que foi um pouco complicado... porque para não pagar parquímetro tivemos de andar às voltas até encontrar um lugarzinho porreiro) e fomos ver o rio. Nada mais refrescante do que estar (e passear) à beira-mar, ou neste caso, rio.
Fomos ao Peter beber um gin tónico (continuo a preferir os da Horta, tendo como pano de fundo o Pico) e continuamos a nossa caminhada. Lembrei-me então, que podíamos ir ver o Oceanário (a única vez que fui ao Oceanário tive de ver tudo à pressa porque estava acompanhado por uma criança) e desfrutar um pouco da calma dum espaço fresco e relaxante.
Como tinha levado a máquina fotográfica, aliava duas paixões (a fotografia e a vida marinha)... mas, eis que, mal entrámos no Oceanário e ligo a máquina... a bateria dá o berro... (my mistake)... e não pude tirar uma única fotografia no oceanário...
foi o drama, a tragédia, o horror...

12 março 2007

Eclipse

09 março 2007

'Cause I love trash!

O meu primeiro computador foi um Macintosh cujo “recycle bin” era um latão de lixo de onde, sempre que deitávamos fora algum ficheiro, saía o Ferrão da Rua Sésamo que cantava “I love it because it’s trash”. Escusado será dizer que eu deitava imensos ficheiros fora, só para ouvir o Ferrão cantar…

Facto é que, tal como o Ferrão, eu também adoro lixo. Não o que se deita fora – embora se possa dizer muito sobre uma pessoa pelo lixo que produz – mas o que se lê nas revistas cor-de-rosa e se pode ver em abundância na televisão nacional. Não há nada de mais relaxante do que pegar numa revista e ver os “bonecos”. Não há nada de mais desconcertante do que um episódio do “CSI. Sobretudo se for a versão “Miami”, onde entra aquele actor ruivo completamente inexpressivo que diz umas frases inacreditáveis e, em cada episódio, salta desesperadamente em bicos de pés a tentar fazer uma imitação de Clint Eastwood nos seus tempos de Harry Callahan…

É bom, sobretudo ao fim de um dia de trabalho cansativo, vegetar no sofá e passar os olhos por algum lixo televisivo. A “Floribela” diverte-me, sou admiradora incondicional da Maria Laurinda do “Tempo de Viver”, não perco um episódio do “CSI” (geralmente adormeço durante, por isso nunca descubro quem é o assassino…), mas o primeiro lugar nas minhas preferências vai inteirinho para a telenovela “Vingança” da SIC, que dá um novo significado à definição de “mau”. Claro que, além de o argumento ser absolutamente destrambelhado, muito ajuda a presença no elenco – como protagonista, claro está – do grande actor Diogo Morgado e da grande revelação que está a ser Teresa Guilherme no papel da maluquinha que, vai-se a ver, ainda acaba por ter mais juízo do que todos os outros juntos e vai ser, certamente, uma peça fulcral para o desenlace – totalemnte imprevisível – da história. É a pura perfeição, enfim.

Da mesma forma, não há como folhear uma “Ana” (a mais atrevida, claro – nada de meias medidas!), uma “Maria” ou uma “Caras” para me sentir, qual Deus, a pairar por sobre as vidas íntimas dos famosos, dos quase famosos e daqueles que nunca o serão, mas que gostam de aparecer mesmo assim. Ele é casamentos traumatizantes, divórcios de sonho, crianças insuportavelemnte bonitas, festas prodigiosas, corpos bronzeados todos com a marca da clínica Persona e loiríssimas extensões capilares. Não há nada que se compare quando se está à espera do dentista ou quando nos sentimos tão cansados que não nos restam forças para puxar pelo cérebro.

Assumo-me como fiel consumidora de lixo. Não me preenche, mas satisfaz-me. Não me assola, mas consola-me. Não aprendo nada, mas descanso. Confesso que passei parte da minha hora de almoço a ler angustiada a Maria, onde a Elsa Raposo – essa grande querida que nunca nos deixa à míngua – confessava, em telefonema à revista, que ter perdido um bebé lhe custava imenso. Acredito. Aliás qualquer psiquiatra concorda que, após um aborto, a coisa mais normal para as mulheres é telefonar para as revistas do coração...

Curiosamente, a “literatura” de cordel (ou melhor, de linha de coser, já que se trata de “literatura light”…) das Margaridas e das Marias Joões não me proporciona a mesma paz, antes me dá vontade de chorar, não pela total ausência de conteúdo, mas pelo pretenciosismo. É que já não há quem aguente, tias!

08 março 2007

Há dias em que me sinto assim...

A princípio é simples anda-se sozinho
passa-se nas ruas bem devagarinho
está-se no silêncio e no borborinho
bebe-se as certezas num copo de vinho
e vem-nos à memória uma frase ba tida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Pouco a pouco o passo faz-se vagabundo
dá-se a volta ao medo dá-se a volta ao mundo
diz-se do passado que está moribundo
bebe-se o alento num copo sem fundo
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

E é então que amigos nos oferecem leito
entra-se cansado e sai-se refeito
luta-se por tudo o que leva a peito
bebe-se come-se e alguém nos diz bom proveito
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Depois vem cansaços e o corpo frequeja
olha-se para dentro e já pouco sobeja
pede-se o descanso por curto que seja
apagam-se duvidas num mar de cerveja
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Enfim duma escolha faz-se um desafio
enfrenta-se a vida de fio a pavio
navega-se sem mar sem vela ou navio
bebe-se a coragem até dum copo vazio
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

E entretanto o tempo fez cinza da brasa
e outra maré cheia virá da maré vaza
nasce um novo dia e no braço outra asa
brinda-se aos amores com o vinho da casa
e vem-nos à memória uma frase batida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida
hoje é o primeiro dia do resto da tua vida

Sergio Godinho,
O primeiro dia

(um dos maiores compositores/letrista actuais)

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07 março 2007

Love is in the air

Cada vez que ouço esta canção lembro-me de um quadro do "Contra Informação" em que o Sr. Pinto da Costa, com uma capa à Super-Homem, cruzava os céus, a caminho de Lisboa para ir ver o seu amor e cantava "Sinto amor no ar/penso eu de que/Sinto amor no ar/a paixão aperta-me".

Mas o que quero contar não tem nada a ver com isso. Quero falar do encontro imediato que tive ontem à noite com um casalinho que estava em plena sintonia de amor. Fui ao supermercado e, a caminho do parque de estacionamento, de carrinho cheio como convém a uma dona de casa zelosa, eis que me deparo com um casal que se beijava apaixonadamente à porta do elevador, completamente alheios ao facto de eu estar a olhar fixamente, já que não podia sair com eles ali à minha frente. Verdade seja dita, eu podia ter tossido, aclarado a garganta, podia ter dito alguma coisa, enfim, fazer-me notada, mas confesso que fiquei fascinada com este momento tão bonito e lá os deixei beijar-se até ao fim, que teimava em não chegar.

Quando voltaram à realidade, viram-me ali de carrinho em punho, porta do elevador escancarada a olhar para eles com um sorrisinho maroto. Ela corou. Ele corou mais ainda (os rapazes são tão tímidos, meu Deus!) e disse-me "Desculpe. É a paixão, sabe..."

Sei, claro que sei. Felizmente sei. Sorri e desejei-lhes que a paixão durasse.

Porque não há sentimento melhor do que este de andar sobre nuvens, de ouvir música a cada passo, de ver as cores mais vivas e os dias mais claros. De trazer um sorriso permanente na boca e ver o nome de alguém por toda a parte. De sentir que somos felizes e nem sabemos bem porquê.

Dizem que a Primavera é propícia este tipo de sentimento. Para mim, os sentimentos predominantes nesta época costumam ser espirros, nariz a escorrer pingo e olhos inchados, por causa da febre dos fenos...

Mas não faz mal porque, "all things considered", sou uma sortuda no amor.

02 março 2007

Bento


Era ainda uma criança quando Manuel Bento começou a defender as redes do Glorioso. Era já um adulto quando Manuel Bento abandonou os relvados como guarda-redes (acredito que um futebolista que adora a sua profissão nunca abandona verdadeiramente os relvados).

Quer isto dizer que cresci a ouvir os relatos do Benfica e da Selecção Nacional (e por vezes a ver os jogos na tv) e me habituei às grandes defesas que o Bento fez na equipa das quinas e ao longo de quase 20 anos no Benfica. 20 anos... uma vida!

Lembro-me, quando era criança, o meu pai se referir a Bento como um "grande maluco". Maluco, no sentido em que era um jogador de uma entrega inexcedível, de uma coragem e de um coração imenso. Discutia os lançes com os avançados como poucos. Não se amedrontava com ninguém e entrava muitas vezes com as mãos e com a cabeça onde muitos não entrariam com os pés.

Depois e antes dele, o Benfica teve grandes guarda-redes, mas pela "raça", pela atitude, pelo carácter, pela mística e pelo amor ao seu clube e à sua profissão, Manuel Galrinho Bento merece o destaque dos demais.

Que descanse em paz!

01 março 2007

Quando morre um dos nossos pais, incia-se um processo de medo constante. Abre-se a caixa de Pandora e, de repente, percebemos que os nossos pais são mortais e que, mais cedo ou mais tarde, iremos perder o outro. Então, aquela parte mais irracional grita-nos das entranhas que o melhor é ser já, agora, o mais depressa possível, porque estamos a viver uma dor adiada, que já conhecemos em parte. Sabemos que o pior ainda está para vir. É a única dor que, de certeza, vamos ter de viver duas vezes.

Mas, sempre que alguma coisa acontece, é como se dezenas de muros se erguessem imediatamente à nossa volta, pensamos, a caminho de casa ou do hospital, que é agora, é desta vez, que vamos passar por tudo de novo e vamos, de facto, saber o que é ficar órfão. E, instintivamente, vamo-nos tornando em gelo porque já sabemos qual a violência do impacto.

Mas, durante a espera, única prece nos ocorre: ainda não, por favor, ainda não. Eu ainda não estou preparada para isto. Como se realmente acreditasse que algum dia virei a estar…

Depois ultrapassa-se a crise e a calma aparente regressa. Mas vive-se sempre alerta, com os olhos no telemóvel e o sono irregular. Estamos sempre sentados na ponta da cadeira, nunca nos acomodamos demasiado tempo num lugar, porque podemos ter de, a qualquer momento, começar a correr. Excepto se esse lugar for tão longe que, mesmo que quiséssemos, não poderíamos acudir e então acontece o fenómeno: a paz. Dormimos uma noite inteira e respiramos fundo porque a distância desresponsabiliza-nos, torna-nos confortavelmente impotentes.

Ontem fiquei a saber que a minha mãe pode ficar cega. Ela tem muitas dificuldades de visão, mas a pouca que tem é suficiente para as actividades mais básicas de cada dia. Ou melhor, ela foi perdendo o sentido ao longo dos anos, e, com mais ou menos revolta, foi-se adaptando às crescentes limitações. Mas a cegueira total aos 70 anos é uma ideia para a qual nem ela nem eu estávamos preparadas. Pode não acontecer. Mas existe essa possibilidade.

Não falámos sobre o assunto. Eu fiz a minha postura forte e decidida e fingi ser optimista. Ela fingiu acreditar em mim.

Ver os nossos pais envelhecer é um triste privilégio. Vê-los morrer é…