(...)
"Solid stone is just sand and water, baby;
Sand and water, and a million years gone by."
("Sand and Water", Beth Neilsen Chapman)
Nunca terei coragem de te dizer nada disto. Nem coragem, nem tempo, nem acho que valha a pena fazê-lo, porque acredito que o sentes muito mais do que eu, que o sabes bem melhor e que, para onde quer que vás, hás-de levar esta memória contigo, em ti, como parte de tudo o que és, foste e para sempre serás.
Lembro-me de um dia perfeito em Agosto, há poucos anos. Era o dia dos teus anos e decidiste passá-lo de uma maneira diferente. Fomos à Comporta, tirámos as roupas e caímos no mar. Fomos perfeitos como o dia, capazes de tudo, despidos de roupas, de diferenças, de preconceitos e de medos. Éramos nós, apenas nós. Sem fronteiras, sem barreiras, sem nenhuma daquelas defesas que as pessoas vão aprendendo enquanto crescem e que apenas servem para nos estrangular a verdade do que somos, para nos roubar as certezas, a capacidade de confiar, de acreditar em coisas como o amor, a vida, a simplicidade. Porque, lá no fundo, eu ainda acredito que tudo nesta vida é simples, tudo é transparente como o mar e todos somos iguais. Sem roupa, ficamos mais iguais ainda. Não indefesos ou envergonhados, mas confortáveis e seguros.
Nesse dia, brincámos, rimos, nadámos, conversámos, inventámos jogos. Não existia mais nada no mundo. Não existia tempo. Não havia vida nem morte, nem esperança nem desespero. Nem o mais pequeno indício da tempestade que se aproximava, que já existia dentro de ti, silenciosa e veloz.
Quero dizer-te que é desse dia que me vou lembrar quando pensar em ti, quando te fores embora. Não é que tenha aceite a tua partida, porque não a aceitei e duvido que algum dia o consiga fazer, mas já que é inevitável, já que sabemos que está a chegar, um dia destes, uma hora qualquer, que eu, tal como tu, não quero saber quando virá (basta-me a certeza de que virá), então vou guardar o melhor de ti e acreditar que te cansaste da cidade, das complicações, do trabalho, das mentiras e das roupas e voltaste para lá, para aquela tarde perfeita na Comporta em que não existia mais nada além de nós, que nos deixámos ser crianças por umas horas, e eu posso ir visitar-te sempre que tiver vontade porque lá será sempre verão e nós seremos simplesmente eternos, simplesmente perfeitos, num dia que se repetirá sempre luminoso e onde o sol nunca se unirá ao mar a anunciar o fim do dia.
Sand and water, and a million years gone by."
("Sand and Water", Beth Neilsen Chapman)
Nunca terei coragem de te dizer nada disto. Nem coragem, nem tempo, nem acho que valha a pena fazê-lo, porque acredito que o sentes muito mais do que eu, que o sabes bem melhor e que, para onde quer que vás, hás-de levar esta memória contigo, em ti, como parte de tudo o que és, foste e para sempre serás.
Lembro-me de um dia perfeito em Agosto, há poucos anos. Era o dia dos teus anos e decidiste passá-lo de uma maneira diferente. Fomos à Comporta, tirámos as roupas e caímos no mar. Fomos perfeitos como o dia, capazes de tudo, despidos de roupas, de diferenças, de preconceitos e de medos. Éramos nós, apenas nós. Sem fronteiras, sem barreiras, sem nenhuma daquelas defesas que as pessoas vão aprendendo enquanto crescem e que apenas servem para nos estrangular a verdade do que somos, para nos roubar as certezas, a capacidade de confiar, de acreditar em coisas como o amor, a vida, a simplicidade. Porque, lá no fundo, eu ainda acredito que tudo nesta vida é simples, tudo é transparente como o mar e todos somos iguais. Sem roupa, ficamos mais iguais ainda. Não indefesos ou envergonhados, mas confortáveis e seguros.
Nesse dia, brincámos, rimos, nadámos, conversámos, inventámos jogos. Não existia mais nada no mundo. Não existia tempo. Não havia vida nem morte, nem esperança nem desespero. Nem o mais pequeno indício da tempestade que se aproximava, que já existia dentro de ti, silenciosa e veloz.
Quero dizer-te que é desse dia que me vou lembrar quando pensar em ti, quando te fores embora. Não é que tenha aceite a tua partida, porque não a aceitei e duvido que algum dia o consiga fazer, mas já que é inevitável, já que sabemos que está a chegar, um dia destes, uma hora qualquer, que eu, tal como tu, não quero saber quando virá (basta-me a certeza de que virá), então vou guardar o melhor de ti e acreditar que te cansaste da cidade, das complicações, do trabalho, das mentiras e das roupas e voltaste para lá, para aquela tarde perfeita na Comporta em que não existia mais nada além de nós, que nos deixámos ser crianças por umas horas, e eu posso ir visitar-te sempre que tiver vontade porque lá será sempre verão e nós seremos simplesmente eternos, simplesmente perfeitos, num dia que se repetirá sempre luminoso e onde o sol nunca se unirá ao mar a anunciar o fim do dia.
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