03 novembro 2003

Querida Cinha,

Ai o que eu gostei de a ver na TV no outro dia! Nem queira saber, até se me lacrimejaram os olhos com as coisas que a menina disse! Fiquei tão emocionada que não quis perder a oportunidade de lhe dar publicamente os parabéns - a si e à administração do Saldanha Residence - pela fantástica campanha Outono-Inverno que lançaram. Raça e pedigree é tudo o que faz falta neste país de gente pobre, feia e rafeira.

Para começar, sempre achei genial a escolha da Cinha para as campanhas anteriores. É que nem consigo imaginar criatura mais bonita que a menina para enfeitar Lisboa que, agora sim, está positivamente mais bonita! Sim, porque dantes era um antro frio e escuro, sem o brilho do seu sorriso a espreitar nos cartazes do Residence. Fez uma diferença que nem imagina!

Fiquei mesmerizada (anota lá esta, Zé Carlos!) com as coisas sábias que disse. De facto, o casaquito de peles fica-lhe a matar e foi uma ideia excelente e muito actual numa altura em que meia dúzia de fundamentalistas armados em espertos andam por aí a protestar contra a captura e morte de animais em benefício da beleza e da moda. Qual defesa dos animais, qual quê! A Cinha é que tem razão! Uma mulher sem um casaco de peles não passa de uma badameca, feia e pobre.

Usar peles é "chiquíssmo" e, afinal de contas, não somos nós quem matou o bicho, não é? Deixamos o trabalho sujo para uns senhores que nós nunca vimos. E o que é que interessa é o resultado, o produto final. Claro que, se não houvesse pessoas a comprar e a usar peles, talvez esses senhores deixassem de ter razões para matar os animaizinhos, mas que diferença fazem as raposas neste mundo? Não servem para animais de estimação, não têm "pedigree", não são boas para comer, por isso só servem mesmo para casaco de peles (isto seguindo a mesma linha de raciocínio dessa outra estrela do nosso firmamento, a Srª D. Isabel de Herédia, que acha - e muito bem! - que os touros bravos não teriam razão de existir se não houvesse touradas...Resta saber qual é a razão de existir da Srª D. Isabel. Ah! Já sei! Se não existisse gente cretina não teríamos de quem dizer estas coisas, não é?)

Querida Cinha, num país que não sabe defender as suas crianças, falar em defesa dos animais é, de facto, redundante. Este país merece-a, minha querida, não duvide disso.

Mas, apesar de tudo, que pena que eu tenho de si! Mesmo que a rica se cubra de peles e de jóias não há-de passar de uma pobre de espírito e essa pobreza é bem mais difícil de disfarçar do que a outra. É que beleza, charme, elegância e essas qualidades que a menina tanto aprecia e defende não passam nem de perto nem de longe por usar ou não uma dezena de animais torturados e mortos às costas.

Mas você não sabe isso e, muito provavelmente, nunca irá saber. Resta-me esperar que as leis kármicas funcionem e a Cinha reencarne como raposa, chinchila, arminho ou qualquer outro animal capturado, torturado e morto neste mundo feito à medida de alguns homens.