19 janeiro 2004

Ary

Vinte anos depois da sua morte, a RTP resolveu abrir o sótão dos arquivos e retirar algumas - escassas - imagens e testemunhos de José Carlos Ary dos Santos. Creio que deveria dar os parabéns à televisão que se diz de serviço público por não ter deixado passar a data em branco, mas não vou fazê-lo. Primeiro porque considero que as pessoas e as obras não podem e não devem ser evocadas apenas quando as datas o exigem; segundo porque um homem da dimensão de Ary dos Santos merecia muito mais do que os poucos minutos que lhe foram dedicados.

No final do programa, a Srª D. Dália de Oliveira, colega e amiga do poeta, contou que um dia, já próximo do fim, Ary dos Santos pediu para ir ao Castelo de São Jorge e, olhando a cidade do topo da sua coroa, disse que tudo o que via era tão lindo que ele tinha de viver.

Enquanto alguém, de cotovelo no Castelo, descansar o olhar pelas colinas da cidade-mulher, a memória de Ary perdurará porque os poetas não morrem, transportam-se a alturas de sonho e vivem para sempre nos mundos que cantaram.

Ninguém como ele soube fazer amor tão bem com a língua portuguesa, por forma e retirar-lhe tão belos sons e tão magníficas imagens. Seu era o poema da primeira canção que me lembro de ouvir, devia ter 3 ou 4 anos e até hoje cada sílaba desse poema me emociona.

Nunca é tarde nem cedo para quem amou tanto.