09 janeiro 2004

Resposta à Anabela

Acabei de ler o comentário que a Anabela fez ao post do João sobre a edição do filme Schindler's List em DVD. Perguntava a Anabela, quando se faria um filme sobre a vida do cônsul Aristides de Sousa Mendes? Pois minha querida, desconfio que a resposta será: nunca.

Quero acreditar (usando uma boa dose daquilo a que os ingleses chamam "wishful thinking") que a maioria das pessoas já tenha ouvido falar em Sousa Mendes, quanto mais não seja na sequência do filme Schindler's List. Na época, lembro-me de ter visto uma ou outra reportagem e um bom documentário, de ter lido um excelente trabalho (se a memória não me falha, na revista Visão) e nada mais. O nome de Aristides de Sousa Mendes não consta dos programas escolares e muito menos das prioridades das pessoas que gerem a "cultura" em Portugal. Desconhecemos a nossa História e gostamos de mostrar com alegria patética a nossa ignorância e desprezo.

Isto, como é óbvio, não se aplica apenas a Sousa Mendes, mas a tudo quanto é história e cultura portuguesas. Não se adaptam as obras dos nossos escritores ao cinema e à televisão, salvo raríssimas excepções. Documentários sobre História, só os do Prof. José Hermano Saraiva, que lá vai mantendo o seu lugar cativo na televisão e no coração dos portugueses e ainda bem! Factos e rigores à parte, ninguém nega que o Professor continue a ser um excelente contador de histórias, alguém que sabe dar vida e emoção às próprias pedras.

Enfim, olho para trás e sinto saudades dos tempos em que o Mário Viegas dizia poesia em horário nobre, ou em que, para adaptar uma obra de Eça de Queiróz à televisão não era necessário mastigar o texto e servi-lo em pequenas doses, adaptadas aos nossos dias, polvilhadas com todos os ingredientes telenovelescos que as pessoas aparentemente já não dispensam.

Excepções à regra: os excelentes argumentos de Francisco Moita Flores (que me fazem perdoar-lhe quase por completo a "Lusitana Paixão", de que falo no parágrafo anterior) e um ou outro esforço pontual para despertar novamente o gosto dos portugueses por aquilo a que se convencionou chamar um dia a nossa "herança comum".

O resto é "Big Brother", telenovela e futebol e pouco mais, até porque, como disse alguém da SIC, nada de programas culturais em prime time! Os "intelectuais" podem muito bem deitar-se tarde, acrescento eu.