09 agosto 2003

Diário de Hospital – Parte IV

2001, 16 Dezembro

Época natalícia deste ano de 2001. Bela maneira de a recordar para toda a minha existência. No dia 8 de Dezembro, após poucas horas dormidas, após uma noite de trabalho, após uma semana de noites "dormidas" a trabalhar, uma discussão... e quando tudo não o poderia prever... explodi. Com 28 anos tive um enfarte !? Como pode tal ser possível?!? Pergunto-me eu ainda a esta hora, cerca de 8 dias depois. Dos vícios acumulados, do modo de vida não saudável que levava, dos hábitos alimentares não ideais, um problema valvular congénito ... tudo se conjugou para um fim... que só por milagre não o foi textualmente.
De um momento para o outro vi-me preso num corpo sem poder dele tirar qualquer partido. Os meus olhos recusavam-se a abrir, os meus membros a obedecer e a minha língua a ajudar-me a emitir sons legíveis. Vi-me de um momento para o outro como um ser vegetal que tudo pressentia, ouvia e mais tarde via, mas nada podia fazer ou dizer. Por essa altura já estava em pãnico, estava com medo de pura e simplesmente, a minha difícil respiração deixar de o ser a qualquer momento, de a minha dor no peito cessar como por milagre, que a minha vida como a conhecia até então se extinguisse. Com a chegada dos paramédicos e do pessoal do INEM a situação estabilizou. Após o enfarte tinha entrado em choque. O outrora frio e confortável chão de mosaico do hall de entrada havia-se tornado uma cruel tortura, com o seu frio acentuado pela transpiração excessiva a que estava sujeito. Passaram-se minutos, talvez horas... não sei, até a situação estar estável para poder ser transportado. Após ECG, comprimidos e análises, oxigénio, soro, sou finalmente transportado para o Hospital de Stª Marta, onde devido a uma pequena deficiência numa válvula sou acompanhado desde que nasci. Hoje, sou o doente da cama 10, já fui o doente da cama 13 na UCI e espero vir a ser outro qualquer número aquando do pós operatório. A vida aqui resume-se a um número, o número da cama. - vc é o 10 ? tem aqui a sua medicamentação. Uma vez por outra, um enfermeiro ou um auxiliar trata-nos pelo nome ou pelo apelido... e aí pensamos como é bom ouvir o nosso nome.