12 agosto 2003

Salto de fé

Na semana passada, uma amiga chamou-me a atenção para esta história. Há quem defenda que as relíquias jacentes na catedral de Santiago de Compostela não pertencem ao apóstolo Tiago mas sim a Prisciliano. Este nasceu na região que pertence hoje à Galiza no século IV. Dono de uma excelente educação, fundou uma seita que pregava a castidade (embora o casamento de sacerdotes fosse consentido) e o ascetismo, abominava a escravatura e prestava culto à natureza. As suas doutrinas tiveram rápida e larga aceitação na Península Ibérica e a ainda jovem igreja católica não tardou em acusá-lo de orgias e outros excessos e a persegui-lo. Foi executado por ordem do imperador Teodósio em Treveris, no ano 389.

Alguns estudiosos (e não só) acreditam que o seu corpo terá sido levado secretamente para a Galiza por seguidores e aí terá recebido sepultura. Quando as ossadas foram descobertas, séculos mais tarde, a Igreja e o imperador Carlos Magno, que pretendiam imbuír a Europa do espirito de cruzada, apressaram-se em reconhecer as relíquias como pertences ao apóstolo Tiago e, como se costuma dizer, o resto é história...

Independentemente de quem esteja sepultado na catedral, e para além de qualquer dúvida ou polémica, ninguém duvida ou desconhece a importância da catedral e da Rota de Santiago que anualmente é percorrida por milhares de peregrinos. Curiosamente, nem todos são católicos ou sequer cristãos. Mais do que um acto religioso, há quem percorra a Rota de Santiago para se encontrar a si mesmo. Por isso há quem diga que, mesmo que um dia venha a fazer-se prova de que não é Santiago quem descansa em Compostela, isso não fará a mais pequena diferença para os peregrinos.

Há uma força maior, que não se curva a religião alguma, e que compele os peregrinos a caminhar em direcção a Compostela. Um dia tenciono fazer essa viagem - há muito que quero fazê-la. Nessa altura talvez consiga descobrir de que é feita a fé.