20 janeiro 2006

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Muito se tem falado nos últimos tempos sobre a máquina administrativa do Estado e do seu peso, quer em termos de custos, quer em termos de burocracia. Trabalho para o Estado e posso garantir que as críticas e maleitas apontadas são, na grande maioria, verdadeiras - há excesso de pessoal na função pública, a maioria das pessoas não tem formação adequada, não tem trabalho que as ocupe durante 7 horas diárias e, se as obrigam a trabalhar, das duas uma: ou ficam doentes, ou ficam zangadas. A filosofia que sustenta este comportamento é a de que se ganha mal e, como se ganha mal, tem de haver um limite para o que se pode e deve fazer.

Claro que este limite varia de serviço para serviço e de funcionário para funcionário, mas, basicamente, traduz-se em fazer pouco, sair cedo, acumular horas e dias para gozar no fim do mês e aproveitar as horas de expediente para fazer as compras, pôr os telefonemas em dia, ficar a par com os resumos das telenovelas e das vidas alheias e lamentar-se sobre o aumento da idade da reforma.

Mas o pior é quando as pessoas querem trabalhar e não as deixam. Tenho uma amiga e colega que decidiu fazer, a expensas próprias, um doutoramento numa universidade estrangeira. Este doutoramento não existe em Portugal e faz todo o sentido na área de trabalho dela. Não existe ninguém com aquele tipo de formação e a instituição onde trabalhamos teria muito a lucrar em ter alguém que dominasse a área em questão.

Ora, para poder frequentar o doutoramento, a minha amiga precisa de tirar uma licença sem vencimento de curta duração, ou seja, precisa que o serviço a dispense, sem lhe pagar o ordenado, durante 2 ou 3 meses. Esta licença foi-lhe negada com o argumento de que esta instituição, tão antiga e conceituada e que, supostamente, tem como missão o desenvolvimento da Investigação, nas suas múltiplas vertentes, não precisa de técnicos superiores doutorados - não só não precisa, como até os considera perigosos, vá-se lá saber porquê!

Resumindo: a administração pública é composta de pessoas a mais e, na sua maioria, com formação deficiente, mas quando uma pessoa quer, às suas custas, melhorar a sua aprendizagem, é proibida de o fazer.

Como diz a canção: "Isn't it ironic?"