14 dezembro 2005

Momento Literário

No pouco tempo livre que tenho à noite, resolvi pegar num livro que tinha para aqui (ainda sem acabar os anteriores) e que me prendeu após os primeiros capítulos. É pequeno, leve, lê-se bem e está escrito de uma forma fluida em que um narrador – muito especial - nos prende até ao epílogo da história. Não estou a falar d’O Código da Vinci – esse já o li há muito, mas do mais recente, ou dos mais recentes, de um escritor angolano de nome José Eduardo Agualusa. Confesso que nunca tinha lido nada de um escritor angolano, mas fiquei curioso para ler mais. Este pequeno livro, O Vendedor de Passados, tranporta-nos até África, pela intensidade dos cheiros, dos relatos, dos nomes, dos locais, baseado numa história só por si, que desperta a curiosidade de algumas pessoas. Félix Ventura é um vendedor de passados. Cria passados para quem quer esquecer o seu. Inventa uma família, desenha a árvore genealógica, escolhe pais, avós, figuras célebres para quem quer ser célebre e ter nobres raízes. A história desenvolve-se a partir desta premissa e tudo corre bem, até que um dia um cliente resolve ser diferente e … (não sei ainda o fim… ainda o estou a ler, mas mesmo que soubesse não iria aqui contar…tendes que ler)

“(…)«A realidade é dolorosa e imperfeita», dizia-me,«é essa a sua natureza e por isso a distinguimos dos sonhos. Quando algo nos parece muito belo pensamos que só pode ser um sonho e então beliscamo-nos para termos a certeza de que não estamos a sonhar – se doer é porque não estamos a sonhar. A realidade fere, mesmo quando, por instantes, nos parece um sonho. Nos livros está tudo o que existe, muitas vezes em cores mais autênticas, e sem a dor verídica de tudo o que realmente acontece. Entre a vida e os livros, meu filho, escolhe os livros.»
A minha mãe! A partir de agora direi apenas Mãe.
Imaginem um rapaz correndo de mota numa estrada secundária. O vento bate-lhe no rosto. O rapaz fecha os olhos e abre os braços, como nos filmes, sentindo-se vivo e em plena comunhão com o universo. Não vê o camião irromper do cruzamento. Morre feliz. A felicidade é quase sempre uma irresponsabilidade. Somos felizes durante os breves instantes em que fechamos os olhos…(…)

José Eduardo Agualusa in O Vendedor de Passados